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Farm completa 20 anos com faturamento de meio bilhão de reais

A grife celebra duas décadas em grande estilo, com festas e shows ao ar livre, parcerias internacionais e lançamento de produtos como cerveja

Por Daniela Pessoa Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 23 jun 2017, 20h24 - Publicado em 23 jun 2017, 15h00
(Anna Fischer/Veja Rio)

Desfilar modelos sob os holofotes das badaladas semanas de moda nunca esteve entre as prioridades da estilista Kátia Barros. Aos 45 anos, a dona da Farm prefere seguir por outros caminhos. Na quarta (21), por exemplo, ela promoveu o chamado “pregão”, para decidir quais peças vão entrar nas próximas coleções. Funciona assim: em uma sala de reunião, cerca de vinte funcionários assistem a uma pequena exibição e dão notas, todas secretas, a cada item apresentado. Apenas os que têm boa pontuação vão para as araras. Essa é uma amostra do estilo heterodoxo de criação e gestão da grife descolada e multicolorida que há duas décadas é sinônimo de carioquice. A fórmula tem funcionado bem: em 2016, foram vendidos 3,6 milhões de peças, o que rendeu 425 milhões de reais, provenientes de setenta lojas, todas próprias, espalhadas por 22 estados do país, além de um parrudo modelo de atacado para multimarcas e da loja virtual.

Tudo é pensado no QG da grife, em São Cristóvão. Ali, uma equipe de vinte designers se dedica a desenvolver novas estampas, o grande trunfo da marca. Outros 580 profissionais, entre funcionárias que cortam as peças e a equipe administrativa, trabalham no local — 500 são mulheres. Na sede há ainda salão de beleza e espaços onde são ministradas aulas de ioga e percussão. Kátia é fanática por samba e festeira de carteirinha. Tanto que ela e sua equipe prepararam uma festa de arromba para comemorar o aniversário de vinte anos da grife, neste domingo (25). A celebração foi pensada nos mínimos detalhes para festejar uma trajetória ascendente num setor da economia fluminense em que longevidade e saúde financeira são vitórias consideráveis. Cheia de novidades — que vão além das roupas e incluem o lançamento de uma banda e linha própria de cerveja, por exemplo —, a Farm deve fechar 2017 com faturamento recorde de meio bilhão de reais e sete novas lojas. “A gente quer mostrar que é possível fazer coisas bacanas e ser bem-sucedido aqui no Rio, mesmo entre tantas adversidades. E, quem sabe, ajudar a levantar o moral da cidade e dos cariocas com um pouco de alto-astral e otimismo”, conta Kátia.

+ A programação completa da festa da Farm neste domingo (25)

Um aspecto curioso chama atenção na história da Farm: a grife que hoje mesmeriza boa parte das cariocas nasceu de um fracasso. Em meados da década de 90, Kátia e Marcello Bastos, 51, sócio-fundador da marca e seu melhor amigo desde a adolescência, resolveram se aventurar no mundo da moda com um negócio que aparentemente era seguro. Com o apoio da família, apostaram as fichas em uma franquia da marca de roupas paulistana Mercearia. O local escolhido para a loja foi o Shopping Iguatemi, em Vila Isabel. Foi um desastre. O estilo das roupas paulistanas não combinava com o lugar e, ao mesmo tempo, a marca-mãe de São Paulo começou a naufragar. As vendas iam tão mal que Kátia começou a produzir roupas e vendê-las na loja sem a anuência do franqueador. “Na época eu já tinha paixão por cores vibrantes. Tingi muito tecido em balde”, lembra-se. Com faturamento em baixa, a dupla e seus familiares precisaram vender dois apartamentos em Ipanema e três carros para cumprir os compromissos assumidos. Kátia e Marcello, com pouco mais de 20 anos, também aprenderam, da forma mais dura possível, os princípios básicos da gestão de negócios. “Para atuar no setor de moda, você tem de ter capital de giro. E o investimento tem de ser pesado e contínuo. Eu, por exemplo, reinvisto tudo na empresa, tanto que moro de aluguel até hoje”, diz Marcello.

(VEJA RIO/Veja Rio)

No mundo dos negócios, é corrente um dito segundo o qual, em chinês, as palavras crise e oportunidade são escritas com o mesmo ideograma. No caso de Marcello e Kátia, essa simbiose entre os dois conceitos se deu em 1997, na forma de um estande de apenas 4 metros quadrados na então novíssima — e badaladíssima — Babilônia Feira Hype. A dupla investiu 1 200 reais no espaço, no Jockey Club, e apostou em pequenas sacadas para chamar a atenção do público. Novidades como decoração feita por arquiteta, vendedoras lindas, bronzeadas, solícitas e motivadas por comissões polpudas transformaram a recém-nascida Farm em sucesso. Formada em contabilidade pela UFRJ, Kátia, que só mais tarde foi cursar moda, já entendia que o importante é oferecer uma experiência ao consumidor para despertar nele o desejo pelos produtos. “A grife se notabilizou por promover ações que ganharam a simpatia de seu público-alvo, mesmo fora das lojas. É só lembrar dos guarda-sóis que foram distribuídos entre os barraqueiros da orla, por exemplo, em 2015”, afirma Paula Acioli, coordenadora do Curso de Gestão Estratégica em Negócios de Moda da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Depois de seis edições da Babilônia, a Farm assumiu a primeira posição em vendas e seus clientes formavam filas nos corredores. Em 1999, abriu sua primeira loja, em Copacabana. Em cinco anos, já eram oito. Depois de Brasília e Belo Horizonte ganharem as primeiras filiais fora do Rio, foi a vez de a marca estrear em São Paulo, no suntuoso Shopping Iguatemi. Em 2008 nasceu um filhote: a Fábula, de roupas infantis, hoje com seis lojas. A parceria com os shoppings foi determinante para o sucesso da empresa. Convidada pelos empreendimentos na fase de ouro da expansão desses centros comerciais, a marca não desembolsou um centavo pela maioria dos pontos nem pelas obras de instalação. O Shopping Rio Sul, por exemplo, arcou com 1,2 milhão de reais para ter a grife entre suas lojas. Vistosa e parruda, a empresa ganhou nova dimensão em 2010. Na ocasião, os sócios negociaram a fusão com outra estrela da moda carioca, a Animale. Com a operação, a Farm ganhou escala, profissionalizou a gestão financeira e passou a crescer em média 22% ao ano. Tanto a Animale quanto a Farm fazem parte, hoje, do Grupo Soma, que vai fechar o ano com receita estimada em 1,3 bilhão de reais. No portfólio da companhia estão ainda nomes como Foxton, FYI, A.Brand e Cris Barros. “A Farm não é escrava das tendências. É muito verdadeira e nunca se perdeu no seu posicionamento”, avalia Roberto Jatahy, sócio-fundador da Animale e CEO do Soma.

Com a expansão no mercado nacional consolidada, a marca de Kátia Barros e Marcello Bastos procura agora crescer além das fronteiras brasileiras. No ano passado, a Farm se lançou no mercado internacional ao oferecer seus produtos no site de e-commerce americano Revolve.com. Em 2017, os vestidos, saias e blusas megacoloridos passaram a ser comercializados na Anthropologie, de Nova York (da multinacional americana Urban Outfitters, um colosso avaliado em 2 bilhões de dólares). A empresa negocia ainda um acordo para ocupar as prateleiras da Bloomingdale’s. Entretanto, antes mesmo das investidas com os americanos, a Farm já ensaiava seus passos no exterior. Em 2013, foi firmada, com a alemã Adidas, uma parceria que já rendeu sete coleções, com 1,3 milhão de peças vendidas na última delas, e distribuição para mais de 100 países. “A Kátia nos recebe nas reuniões com pão de queijo e bolo feito em casa. Toda essa energia fica marcada na alma da empresa”, afirma Tiane Allan, gerente da Adidas Originals Brasil. As collabs (de collaboration), nome usado no mundo fashion para designar as parcerias entre marcas, estão no DNA da grife carioca há tempos e já renderam associações com nomes poderosos como Havaianas, Disney, Pantone, Birkenstock e Converse.

É natural que uma marca com tanta visibilidade atraísse não apenas admiração, mas também sofresse o ônus da superexposição. Em 2014, um editorial em que modelos brancas usavam turbante e representavam Iemanjá inspirou acusações de racismo e apropriação cultural. Mais tarde, uma cliente, nas redes sociais, denunciou a marca por prática de “gordofobia”, ao ser discriminada em uma das lojas. Marcello Bastos usou os perfis da Farm para se desculpar, pessoalmente, pela postura das vendedoras. “Machuca, mas é a partir da dor que aprendemos e evoluímos”, diz Kátia. “Criamos grupos de estudo para nos aprofundar nos assuntos delicados e entendemos que precisamos, sim, lançar tamanhos maiores de roupa. Isso já deve acontecer no ano que vem”, completa Bastos.

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Com uma estratégia de marketing pouco convencional (além de não participar de desfiles, não faz publicidade, por exemplo), a Farm resolveu comemorar suas duas décadas em grande estilo. Para tanto, apostou em um festão na orla de Ipanema e Leblon. Sete palcos foram erguidos do Posto 12 ao Arpoador para abrigar shows, entre eles o da banda Flor de Sal, criada especialmente para a ocasião — uma aposta da empresa no mercado musical. “Não somos apenas uma grife de roupa, somos uma marca de comportamento”, diz Kátia. Depois da estreia do conjunto, outra novidade: o primeiro desfile da história da Farm. O cenário escolhido foi o Arpoador, com modelos flanando por uma passarela em formato de ondas. No Parque Garota de Ipanema, uma feirinha em clima de arraial tropical assinala a chegada da cerveja da Farm, desenvolvida em parceria com a marca Praya (confira a programação completa de domingo, 25). “Pensamos nesse evento como uma maneira de festejar nossa trajetória e apontar para o futuro”, diz Kátia. Não à toa, prepara-se, em São Cristóvão, uma fornada de produtos, prevista para agosto, que inclui uma linha de roupas de cama e outra de louças de cozinha.

(VEJA RIO/Veja Rio)

O Rio sempre foi a vitrine da moda brasileira, um setor que movimenta 153 bilhões de reais ao ano no país. A participação do estado (7,6%) nesse montante supera a média das outras unidades da federação — 6,2%, segundo a Fecomércio-RJ. Desde 2015, no entanto, a crise econômica vem transformando o mercado carioca. Grifes como a Espaço Fashion, que nasceu junto com a Farm na Babilônia Feira Hype, a Checklist e a Shop 126 simplesmente desapareceram ou encolheram. A Totem, outro símbolo local, voltou seu foco para o e-commerce, uma operação de custo reduzido. Quem se dá bem segue uma receita sustentada por rigoroso controle financeiro e forte identificação com o consumidor. É o caso de Reserva, Ateen e Cantão.

As marcas mais poderosas do mundo, por sua vez, têm investido pesado em inovação — não apenas em produtos e gestão, mas também no relacionamento com o público. Inaugurada em novembro de 2016, em Nova York, a nova loja-conceito da Nike, de cinco andares, oferece espaços onde os consumidores podem praticar esportes e testar produtos com a ajuda de realidade virtual. Por meio de aplicativo de celular, os vendedores recebem chamados de clientes, acessam o estoque e processam as compras. Há alguns meses, também em Nova York, Kátia conheceu uma unidade da Zara, localizada no Soho, e ficou encantada. Na entrada do provador, um concierge passava as peças por um leitor digital. Uma vez na cabine, era possível ver em uma tela os itens a ser experimentados em todas as cores e tamanhos disponíveis no estoque. Para solicitar outras opções, bastava um clique. “Meu sonho é ser uma Zara. A Farm daria uma loja de departamentos incrível”, confidencia Kátia. Ambição é o que não falta à grife favorita das cariocas descoladas.

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