William Siri: “Construímos políticas ouvindo quem vive o problema”
Vereador William Siri fala sobre desafios, conquistas e a importância da escuta na construção de projetos para toda a cidade — e especialmente para a zona oeste

Economista, cristão e vereador pelo segundo mandato na Câmara do Rio, William Siri (PSOL), 32 anos, tem a zona oeste como prioridade política e afetiva. Nascido na Baixada Fluminense e morador de Campo Grande, fundou em 2014 o coletivo TudoNumaCoisaSó, dedicado à valorização das periferias, seus movimentos culturais e à promoção de políticas públicas para esses territórios. Reconhecido como um dos cinco parlamentares mais atuantes da cidade em seu primeiro mandato, Siri apostou na produção de relatórios para fundamentar propostas e colaborar para a fiscalização do poder público. Em conversa com VEJA RIO, traça um panorama de sua atuação, com foco em pautas como educação, sustentabilidade, inclusão e serviço público, destaca as principais prioridades e fala sobre planos para voos mais altos — incluindo a intenção de chegar ao governo do estado.
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Como surgiu o seu desejo de entrar para a política? Eu nasci em Nova Iguaçu e me mudei ainda criança para Campo Grande, onde moro até hoje. Desde cedo, percebi como a cidade é partida: a Baixada e a zona oeste ficam distantes do centro e da zona sul, e isso mostrou pra mim a desigualdade urbana na prática. Quando cursei economia, no Centro, eu acordava antes das 5 horas para pegar o trem, enquanto colegas da Tijuca e da zona sul saíam muito mais tarde e chegavam no mesmo horário. Foi nessa época que me envolvi no movimento estudantil e fui secretário-geral do diretório que representava vários cursos, lá em 2013, um ano muito político. Em 2014, com o desejo de levar o debate político para a periferia, fundamos o coletivo TudoNumaCoisaSó.
Como nasceu esse movimento e com qual propósito? A ideia era pensar a cidade a partir da zona oeste, mostrando que a periferia tem voz, cultura e pensamento crítico. Do coletivo nasceram vários projetos, como a Caminhada pela Liberdade Inter-Religiosa da Zona Oeste, que este ano chega à nona edição, reunindo representantes das mais diversas crenças. Também atuamos fortemente na valorização cultural da região, com políticas de reconhecimento do patrimônio material e imaterial. Em 2016, me candidatei a vereador com uma campanha construída dentro do coletivo. Em 2020, voltei a me candidatar e fui eleito. Agora, no meu segundo mandato, sigo construindo essa trajetória junto ao coletivo, sempre pensando a cidade pela ótica das periferias, em especial, da zona oeste.
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Como foi trazer esse olhar do coletivo para o trabalho na Câmara dos Vereadores? Trouxemos para o mandato uma lógica baseada em escuta e produção de dados. Criamos dez relatórios temáticos focados na zona oeste. Ouvimos a população, sistematizamos as informações e propusemos soluções reais. É uma metodologia participativa, feita com quem vive o problema. Já fizemos relatórios sobre transporte, cultura e educação, sendo este último produzido durante a pandemia para entender o retorno às aulas na rede pública da zona oeste. E esses relatórios não ficam na gaveta: eu entrego pessoalmente para as secretarias.
A educação pública é um dos temas mais recorrentes na sua atuação. Que projetos têm sido desenvolvidos nessa área? Nossa equipe é formada por seis educadores, então isso orienta bastante nossa atuação. Em 2023, fizemos um segundo relatório sobre a rede municipal, após visitar mais de 140 escolas. O material mostrou problemas sérios, como a precarização das instalações, a sobrecarga de professores e a terceirização crescente. Aprovamos também a meia-entrada para professores de pré-vestibulares sociais, como o que mantemos desde 2019 e que hoje atende cerca de 200 alunos. Outra luta em que nos engajamos foi pela convocação dos concursados de 2018 e 2019. Alguns foram chamados, mas só depois de muita mobilização.
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Como presidente da Comissão de Trabalho e Emprego na Câmara, quais são as principais pautas que você tem priorizado em seu mandato? A valorização do serviço público é uma das nossas defesas centrais. Lutamos por melhores condições de trabalho e pela correção do vale-refeição e alimentação para servidores, congelados desde 2012. O debate pelo fim da escala 6×1 também é constante. Atualmente, estamos finalizando um relatório sobre as feiras livres da cidade: visitamos mais de 50 para ouvir os feirantes e entender suas demandas, que vão desde a falta de banheiros até a necessidade de incentivos. Muitos trabalham de modo informal, sem CNPJ ou cooperativa, e recebem pouco apoio. As feiras movimentam a economia e cultura locais, mas continuam invisibilizadas, especialmente na zona oeste.
Falando em invisibilidade, outro tema que você tem debatido é o da inclusão nos estádios esportivos para pessoas autistas. Como surgiu esse projeto? Ele nasceu do diálogo com torcidas inclusivas, como a Autistas Rubro-Negros. Um pai nos procurou após o filho com Transtorno do Espectro Autista ter uma crise durante um jogo e precisarem sair às pressas. Isso nos levou a propor uma lei que exige que estádios com mais de 5 000 lugares tenham salas de inclusão. Aprovamos em 2023, com 180 dias para implementação. A aplicação tem sido lenta, mas já há avanços. O Maracanã iniciou as obras para duas salas sensoriais em junho desde ano, o São Januário criou um espaço provisório, e até o Estádio de Moça Bonita, em Bangu, aderiu. É um exemplo de como construímos políticas públicas a partir da escuta.
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Uma área em que os debates são urgentes, mas o avanço ainda é lento, é o meio ambiente. O que foi conquistado até agora? Conseguimos aprovar a inclusão da educação climática nas escolas municipais, para que a mudança climática seja tratada desde cedo, com mais profundidade. Tivemos também uma grande vitória ao aprovar a lei que cria as bases para transformar o Rio numa “cidade-esponja”, um conceito internacional que traz soluções como asfaltos drenantes, calçadas permeáveis, jardins de chuva e parques alagáveis, que ajudam a evitar alagamentos e enchentes. Essa lei é de nossa autoria e já há iniciativas pontuais, mas é fundamental que esses mecanismos alcancem toda a cidade, não só os bairros mais privilegiados.
Sendo um dos fundadores do Movimento Inter-Religioso da Zona Oeste (MIR-ZO) e cristão evangélico, como você enxerga essa convivência entre diferentes crenças? Quando observo como Jesus se relacionava com as pessoas, vejo que havia uma diversidade enorme, e ele sempre as respeitava. Esse cristianismo que enxerga outras religiões como inimigas não é o meu. Acredito que todas as crenças têm seu espaço. No início da Caminhada pela Liberdade Inter-Religiosa, admito que enfrentei um conflito interno — questionava se estava agindo para conquistar votos ou por convicção. Hoje, compreendo que respeitar as outras religiões é, na essência, viver o Evangelho de Cristo.
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Dentro da política, quais caminhos você pretende trilhar nos próximos anos? Meu sonho, na verdade, é um dia ser presidente do Brasil. Venho de uma família de trabalhadores e quero construir uma política que reflita essa vivência. Comuniquei a intenção de me canditadar ao governo do estado em 2026 porque acredito que é possível pensar o Rio de Janeiro a partir da periferia, com outra perspectiva e outras prioridades. Ser evangélico, economista e morador da zona oeste me coloca num lugar que quebra estereótipos, inclusive dentro da esquerda. Com o nascimento da minha filha, esse desejo de transformação ganhou ainda mais força. Quero que ela cresça em um lugar com educação, segurança e oportunidades.