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O charme da velharia

Em tese fadadas a virar peças de museu, vitrolas, filmadoras e máquinas fotográficas antigas conquistam jovens admiradores

Por Sabrina Wurm
Atualizado em 5 jun 2017, 14h54 - Publicado em 29 jul 2011, 13h43

Eles estão na faixa dos 15 aos 25 anos e integram a chamada geração digital, denominação que denota a importância da tecnologia para essa turma. Mas por que um jovem habituado a baixar rapidamente para seu MP3 toda a discografia de um artista resolve voltar no túnel do tempo do consumo e cai de amores pelos discos de vinil? Ou alguém que se acostumou a armazenar imagens no pen drive de repente ressuscita antigas máquinas fotográficas, trambolho que parecia aposentado? Por mais defasadas que as atitudes possam parecer, é crescente o número de pessoas que vêm se tornando usuárias de aparelhos analógicos, em tese fadados ao museu.

Foi o caso do carioca André Augusto Motta dos Santos, 17 anos, aluno do 3º ano do ensino médio da Escola Parque. Para surpresa dos pais, ele instalou no quarto uma vitrola da década de 60 que pertenceu a sua avó. O estudante se aproximou recentemente do universo dos vinis, incentivado por seu professor de guitarra, Marcelo Cardoso, um dos maiores colecionadores de LPs da cidade, com 6?000 álbuns. Bem mais modesto, o acervo de André reúne cinquenta discos, entre eles Wave, de Tom Jobim, e Aqualung, da banda de rock progressivo Jethro Tull. “É muito louco. O som vem da agulha em contato com aquele disco girando”, diz, ainda espantado.

Não espere desse grupo um discurso reacionário ou na linha dos luditas, como ficou cunhado o movimento contra os avanços industriais na Inglaterra do começo do século XIX. O sentimento que remete essa garotada ao passado é o mesmo que a leva a fazer fila na porta da loja da Apple em busca do iPad recém-lançado: a curiosidade pelo novo. Para quem jamais viu de perto uma máquina de escrever, por exemplo, seu simples funcionamento é novidade. Esse raciocínio vale também para toca-discos e outros objetos adormecidos em antiquários e que vêm sendo exumados por uma turma de admiradores. Para o universitário Guilherme Ourivio, 22 anos, ligar a vitrola envolve um charmoso ritual. “Não é como ouvir MP3, que te permite fazer outras coisas ao mesmo tempo”, diz. “Quando ouço um LP, dou logoff do Facebook.”

Fernando Lemos
Fernando Lemos ()
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Até recentemente, o redescobrimento do vinil era alimentado pelo saudosismo de quem viveu o reinado das bolachas, entre os anos 50 e 80. Apesar de nunca ter sido encerrada totalmente na Europa nem nos Estados Unidos, a fabricação de LPs foi retomada com força por selos independentes para atender à demanda crescente. Esse movimento se verifica também por aqui. Em 2009, a fábrica de LPs Polysom, referência do gênero na América Latina, foi reativada pela gravadora Deck­disc, que lançou em vinil obras de nomes do pop rock nacional, como Nação Zumbi e Pitty, à venda em lojas especializadas. Uma das mais movimentadas do Rio, a Tropicália Discos, no Centro, parou recentemente de trabalhar com CDs. “Decidi me concentrar só no vinil porque tem mais saída”, conta o proprietário Bruno Alonso.

Na fotografia, a inclinação para o aparato analógico pode ser medida pelo sucesso das máquinas Lomo, criadas na, essa sim, finada União Soviética e novamente em voga no comércio. Elas passaram a ser objeto de culto por uma espécie de seita, a Sociedade Lomográfica Internacional, fundada há vinte anos. A marca tem 22 lojas pelo mundo, sendo uma delas no Rio. Inaugurada em 2009, numa galeria de Ipanema, a loja carioca, após um problema no contrato de locação em seu endereço original, vem funcionando provisoriamente em uma butique no mesmo bairro. Em pouco mais de um ano e meio de atividade, tornou-se um dos cinco pontos da rede global com maior volume de vendas, impulsionadas principalmente pelos jovens. Eles são atraídos pelo visual retrô e pela engrenagem mecânica da máquina, que usa rolos de filme. “A surpresa na hora da revelação é o que mais me seduz”, diz a universitária gaúcha Nicole Mallmann, 20 anos, que veio ao Rio participar de um workshop sobre a câmera, ao lado das estudantes Isabela Silva e Rafaela Lessa.

Dentro desse movimento de recuperação de tecnologias superadas, a filmadora super 8 é um ícone da cultura de resistência. Antes da era VHS ? que, por sinal, há muito já ficou para trás também ? era ela a responsável pelos filmetes que exibiam festas, viagens e momentos em família, algo hoje a cargo dos celulares. Curiosamente, um dos aplicativos do iPhone 4 é a 8mm Vintage Camera, que registra imagens em um clima retrô. Em junho, a filmadora voltou a ser assunto nos Estados Unidos com a estreia do longa-metragem Super 8, dirigido por J.J. ­Abrams, um dos criadores da série Lost. O passado está sempre batendo à nossa porta.

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