“Somos um grande centro de coordenação”, diz Nicola Miccione
Secretário da Casa Civil do Estado fala sobre os desafios, conquistas e o papel de articulação da pasta em projetos estratégicos para a cidade

À frente da Casa Civil desde 2020, Nicola Moreira Miccione conhece de perto os bastidores das decisões do governo estadual. Advogado formado pela Universidade Federal do Ceará, com pós-graduação em direito processual civil pela Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará e MBA em gestão empresarial pela Universidade de São Paulo, acumulou quase duas décadas de experiência no Banco do Nordeste, atuando em áreas jurídicas e na promoção de investimentos. Natural do Pará, fincou laços no Rio — onde recebeu, em 2024, os títulos de Cidadão e Benemérito do Estado pela Assembleia Legislativa. No comando da pasta, coordenou processos como a concessão do saneamento — considerado o maior projeto socioambiental em andamento na América Latina e modelo para outros estados — e o programa Pacto RJ, que reúne 17 bilhões de reais em investimentos em diferentes setores. Em entrevista a VEJA RIO, Miccione detalha o funcionamento da Casa Civil e aborda os desafios e os principais projetos acompanhados hoje pela secretaria.
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Qual é o papel da Casa Civil dentro do governo do estado? A Casa Civil funciona como um grande centro de coordenação, reunindo o corpo técnico mais qualificado e operando como a primeira linha de comando do governador. Cabe à pasta articular as ações demandadas por ele com as secretarias — que têm sua autonomia —, além de atuar junto a outros poderes, órgãos e entidades da sociedade civil. Se o governo fosse uma empresa, a Casa Civil seria como o CEO responsável por executar as diretrizes do presidente, o governador. Mais do que encaminhar demandas, acompanhamos os desdobramentos e cobramos resultados. Somos também responsáveis pela publicação do Diário Oficial, pelas nomeações e pela supervisão de estatais.
No começo de julho, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou a aplicação de uma tarifa de 50% sobre os produtos importados do Brasil. Qual impacto essa medida terá sobre a economia fluminense? O Rio de Janeiro é o segundo maior estado exportador para os Estados Unidos, com 7,4 bilhões de dólares em vendas no último ano, principalmente de petróleo refinado e semimanufaturados de ferro e aço. Para enfrentar os efeitos dessa medida, que deve entrar em vigor em agosto, criamos um grupo de trabalho executivo, liderado pela Casa Civil, com o apoio de secretarias estratégicas e instituições do setor produtivo. O objetivo é construir um estudo aprofundado, definir ações concretas para minimizar os impactos e proteger empregos e investimentos no estado.
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A pasta participou da retomada das obras do metrô da Gávea. Como esse processo foi conduzido? A Casa Civil passou a coordenar a retomada das obras do metrô da Gávea após uma demanda do governador, Cláudio Castro. Em articulação com a Secretaria de Transportes, a Procuradoria Geral do Estado, o Ministério Público e o Tribunal de Contas, construímos uma solução jurídica e técnica que evitou uma nova licitação e garantiu segurança para manter o consórcio anterior. O Termo de Ajustamento de Conduta [TAC] prevê investimento de 600 milhões de reais pela concessionária, 97 milhões de reais pelo governo e 300 milhões de reais de reserva. Também resolvemos a unificação das linhas, antes operadas por dois consórcios distintos, para eliminar a duplicidade de tributação, perdas operacionais e logísticas, tornando a operação mais eficiente.
O Rio foi pioneiro na concessão de saneamento após o Novo Marco Legal. O que diferencia o modelo desenvolvido pela Casa Civil e quais são os resultados até agora? O projeto atraiu cerca de 25 bilhões de reais em outorgas, a maior parte destinada aos municípios. Os recursos permitiram novos investimentos, que estão reunidos no Programa Pacto RJ [www.pacto.rj.gov.br]. A Cedae [Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro] saiu mais fortalecida, focando a produção de água com obras estruturantes, como o Novo Guandu, enquanto concessionárias assumiram a distribuição e o esgotamento sanitário. Desde então, mais de 14 000 empregos foram gerados e cerca de 13 milhões de pessoas foram beneficiadas. Ambientalmente, também temos avanços visíveis: a Lagoa Rodrigo de Freitas foi revitalizada, o Complexo Lagunar da Barra e Jacarepaguá recebeu investimentos e a Baía de Guanabara apresenta sinais concretos de recuperação, com praias balneáveis e fauna marinha retornando.
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Em 2024, o Complexo do Maracanã foi concedido ao consórcio Fla-Flu. Quais são os ganhos esperados? A nova concessão foi construída com diálogo intenso com o Tribunal de Contas, que validou uma exigência fundamental: a garantia de que o estádio seguiria priorizando o futebol. Em 2024, o consórcio Fla-Flu venceu a licitação de forma transparente. O contrato de 20 anos prevê cerca de 180 milhões de reais em investimentos no Maracanã e no Maracanãzinho, além do pagamento de outorgas fixa e variável. Ganha o estado, que moderniza um patrimônio público sem abrir mão da regulação; ganham os clubes e a população, que mantêm um estádio vivo e à altura da importância do futebol no Rio.
O governo pretende conceder o Estádio de Remo da Lagoa à iniciativa privada. Qual é a proposta dessa concessão? A ideia é transformar o Estádio de Remo, localizado dentro do complexo Lagoon, em um espaço multifuncional, com centro de convenções, eventos, gastronomia e cultura. O edital deve ser lançado entre agosto e setembro. O governo quer atrair a iniciativa privada sem limitar o uso do espaço a uma única atividade, respeitando sua localização e vocação. Com o turismo em crescimento, a revitalização da Lagoa e o projeto de revitalização do Jardim de Alah em andamento, este é o momento ideal para tornar o Estádio de Remo um novo polo de cultura, lazer e esporte no Rio.
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Com o fim do contrato atual previsto para 2027, como está o processo de decisão sobre a nova concessão ou renovação do serviço de gás canalizado no estado? Estamos avaliando, com o apoio da Fundação Getulio Vargas e da Agenersa, qual seria o melhor caminho. A decisão será baseada no valor justo da outorga e na capacidade de garantir investimentos e continuidade do serviço. A nova concessão pode injetar bilhões na economia fluminense. Como maior produtor de gás natural do país, o Rio precisa de um contrato moderno que assegure a expansão da rede com preços competitivos para indústria, comércio e residências.
O Museu da Imagem e do Som está com as obras retomadas e em andamento. Qual é a expectativa para o retorno das suas atividades? A previsão é concluir a construção do MIS até o fim de 2025 ou início de 2026, com uma abertura gradual no começo do próximo ano. O projeto está alinhado a uma das principais diretrizes do governo atual: usar recursos da concessão do saneamento para retomar obras paradas e valorizar o investimento público já realizado. O estado também tem feito um investimento histórico em cultura, aplicando mais de 200 milhões de reais anuais pela Lei de Incentivo à Cultura, além de recursos diretos para manutenção e revitalização de equipamentos. O MIS será a coroação desse esforço cultural.