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A responsabilidade é dele

O presidente da Rio Eventos enfrenta seu grande teste ao receber a multidão de fiéis que chega para a Jornada Mundial da Juventude

Por Felipe Carneiro
Atualizado em 5 jun 2017, 13h55 - Publicado em 24 jul 2013, 16h13
Tomás Rangel
Tomás Rangel (Redação Veja rio/)
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Mineiro de Baependi, o advogado Leonardo Maciel, 36 anos, é católico praticante e devoto da beata Nhá Chica, a filha de escravos que viveu no século XIX, a quem se atribuem graças, curas e milagres. Nada disso o impediu de dizer um sonoro “não” ao arcebispo dom Orani Tempesta e vetar, como presidente da Rio Eventos, a instalação de uma atividade paralela à Jornada Mundial da Juventude (JMJ) na praça em frente ao Pão de Açúcar, na Urca. A negativa se deu em meados de maio, no gabinete de Maciel, quando dom Orani chegou com tudo pronto ? mapas, croquis, banners e cartazes ?, certo de que o projeto seria aprovado. Saiu dali desapontado. Na decisão, pesou o impacto sobre o trânsito e a circulação nos arredores de uma das atrações mais importantes do Rio, em um momento em que a cidade estará apinhada de visitantes. O bispo reclamou com o prefeito Eduardo Paes, chefe de Maciel, que apoiou o subordinado. A feira, a ser aberta no dia 23, acontecerá em outro lugar, na Quinta da Boa Vista.

O episódio descrito dá a dimensão da importância que Maciel e a Rio Eventos, dois ilustres desconhecidos da maioria dos cariocas, ganharam desde que a entidade foi criada, em dezembro do ano passado. Da sede da empresa municipal, localizada em um prédio da Cidade Nova, ele se tornou uma espécie de “prefeito dos grandes eventos”. Sua missão é centralizar as decisões sobre o funcionamento da cidade em acontecimentos como a JMJ e a Copa do Mundo e articular a ação de dezenas de secretarias municipais e estaduais, ministérios, órgãos e instituições envolvidos. Nessa posição, Maciel tem carta branca para impor metas, resolver conflitos, cobrar resultados. Além do embate com dom Orani, ele bateu o pé, por exemplo, quanto à decretação dos feriados no período de visita do papa Francisco ? o prefeito era contra, mas acabou convencido de que era a melhor maneira de evitar um colapso no trânsito. “Eu precisava de alguém multitarefa e em quem eu pudesse confiar. O sucesso da Copa das Confederações mostrou que eu fiz a escolha certa”, diz Eduardo Paes.

É evidente que tamanha responsabilidade exige capacidade de organização, firmeza de propósitos e coragem para desagradar a pessoas poderosas. Pelos cálculos do próprio Maciel, ele já tomou pelo menos 1?000 decisões nos últimos oito meses. O número tem como base a média de três reuniões diárias com aproximadamente 45 órgãos e instituições. Desde dezembro, houve mais de 600 encontros. O contato com o prefeito é praticamente ininterrupto via mensagens de celular e reuniões (Paes só rivaliza com dom Orani, que consegue mandar seus SMS antes mesmo das 6 da manhã). Da mesma forma, Maciel ouve e é ouvido por figurões da República como os ministros Gilberto Carvalho e Gleisi Hoffmann, passando por secretários como Régis Fichtner e empresários (veja o quadro ao lado). Faz a mediação das rusgas entre Exército e polícia, dá pitaco na agenda do papa e é um dos poucos a dizer o que a Fifa pode e o que não pode fazer fora dos limites do Maracanã. A cada quinze dias, reúne um batalhão de mais de 100 pessoas no Palácio da Cidade, em Botafogo, para ajustes gerais de ponteiros, e distribui deveres de casa para todos resolverem nas duas semanas seguintes, um ritmo que deve ser mantido nos próximos meses, para a avaliação dos impactos da Copa das Confederações e da Jornada da Juventude. “Eu tenho de me pautar pelo detalhe e estudar os assuntos com profundidade. Não posso afrouxar nada porque a conta cai mesmo é no meu colo”, explica Maciel.

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A sequência de grandes acontecimentos no Rio ? JMJ, Copa, Aniversário de 450 anos e Olimpíada ? num espaço tão curto de tempo é inédita no mundo, e dificilmente vai se repetir. Para lidar com um desafio tão expressivo, a prefeitura se saiu com uma solução igualmente sem precedentes para conseguir gerir tantas panelas no fogo ao mesmo tempo. A ideia não surgiu do nada. Na verdade, foi inspirada em experiências de Barcelona e Londres, entre outras metrópoles, que designaram uma espécie de síndico para manter em funcionamento seus projetos olímpicos. A origem está em 1984, em Los Angeles, quando o executivo Peter Ueberroth foi nomeado para comandar uma edição dos Jogos bastante complicada. Montreal havia tido um prejuízo imenso ao sediar o evento oito anos antes, a então União Sovié­tica sofrera um boicote e, em revanche, liderou outro, enquanto os Estados Unidos viviam uma crise econômica. A própria população local estava reticente. Pois o evento acabou sendo um sucesso absoluto em todos os aspectos, Ueberroth foi eleito o homem do ano pela revista Time e até hoje vive de palestras sobre o tema. Não à toa, as versões de Barcelona e Londres tiveram na proa gestores poderosos, capazes de articular as diferentes esferas envolvidas aos interesses da cidade ? respectivamente, os empresários Sixte Cambra e Jeremy Beeton. “Você precisa de alguém que enxergue o todo de cima, que entenda o cronograma, que tenha a liderança para fazer a coisa andar quando aparecerem os obstáculos ? que vão aparecer ? e saiba lidar com dinheiro”, resume o britânico Beeton.

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Embora seja pouco conhecido, Maciel não é novato no ramo. Entediado com a vida de tributarista no escritório Tostes e Associados Advogados e disposto a se dedicar a uma área completamente diferente, candidatou-se a uma vaga no setor jurídico dos Jogos Pan-Americanos em 2007. Foi chamado quando a concorrente escolhida pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB) abandonou o posto apenas uma semana depois de ter assumido o cargo. No Pan, Maciel ganhou experiência em encrencas como a pirataria de produtos com a marca oficial do evento e a controversa deserção de quatro atletas de Cuba, dois deles devolvidos pelo governo brasileiro ao país de origem. Encerrada a competição, ele se engajou na equipe que preparou a candidatura do Rio à Olimpíada de 2016, estreitando laços com o então secretário-geral do comitê organizador do projeto, Carlos Roberto Osório, o atual secretário municipal de Transportes. Foi Osório quem levou Maciel para a prefeitura, em 2010. “Ele tem uma sólida formação técnica, conhece os ritos administrativos e é bem relacionado em todos os níveis de governo. Perfeito para tirar um projeto do papel”, atesta Osório. Esse traço fez com que fosse convocado para erguer o Centro de Operações da Prefeitura, que botou de pé em seis meses. Atualmente, no comando da Rio Eventos, enfrenta uma dor de cabeça diferente, como a eclosão de manifestações pela cidade. Na primeira pedreira, durante a Copa das Confederações, o saldo foi positivo. “Tivemos de aprender como juntar não apenas um cuidadoso planejamento, mas também a capacidade de reagir rapidamente quando surgem os problemas”, afirma ele. A Fifa, que entende de padrões, considerou o modelo adotado no Rio o melhor do país.

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Vida pessoal não combina muito com a atual missão de Maciel. Sua rotina começa invariavelmente às 6 da manhã e não tem hora para acabar. Durante a Jornada Mundial da Juventude, está preparado para virar a noite e emendar entre os dias 26 e 27. Quando tem um tempinho livre, reúne-se com os amigos do Colégio Padre Vieira e da faculdade Candido Mendes para uma cervejinha no bar Rebouças, um pé-sujo do Jardim Botânico, onde mora. Nessas ocasiões é conhecido apenas como Mineiro, por causa da sua origem, embora viva no Rio desde os 16 anos. O amor tem sido um desafio maior do que os grandes eventos. No Pan, escolheu um único jogo para assistir, e de quebra impressionar a paixão da vez. Pois mal a seleção de Bernardinho deu o primeiro saque contra a Venezuela o celular de Maciel tocou: um pilantra falsificara uma credencial e fora flagrado na porta do Maracanãzinho. Enquanto Mineiro passou a noite na 18ª DP, o affair tratava de virar ex. O enredo se repetiu outras vezes, com outros nomes e outros cenários. Recentemente, começou um namoro. Mas faz questão de proteger a identidade de Diana, de quem só revela o primeiro nome e que trabalha com moda, “o que me obriga a conversar sobre outros assuntos que não o trabalho”. Confessa que seu sonho é ter um casamento para a vida inteira e uma família de comercial de margarina. Até as chamas da tocha olímpica se apagarem, em agosto de 2016, Diana e o sonho terão de esperar.

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