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Instituto Serrapilheira, no Leblon, incentiva jovens talentos da ciência

O centro de apoio a pesquisas foi criado em 2017 pelo casal Branca Vianna, linguista e intérprete, e João Moreira Salles, documentarista

Por Carolina Barbosa
Atualizado em 13 fev 2020, 11h44 - Publicado em 5 fev 2020, 13h23
A bióloga carioca Ayla Sant’Ana: pesquisas sobre o açaí resultaram na primeira patente verde já registrada no INT (Leo Lemos/Veja Rio)
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A curiosidade científica levou a bióloga carioca Ayla Sant’Ana, de 35 anos, a se debruçar sobre um tópico que pode soar miúdo, mas não é. Ela vem investigando maneiras de transformar a semente de açaí em algo útil, uma vez que 85% dela é descartada, tornando-se um enrosco ambiental na Região Norte do país. Ayla estudou a composição e as propriedades das sementes até chegar a respostas que ecoaram nas altas-rodas da academia. O trabalho foi publicado na prestigiada revista Nature Scientific Reports e resultou em uma patente reconhecida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial na área de sustentabilidade, feito notável pela relevância. A bióloga descobriu nas sementes uma molécula de aplicações diversas: ela pode entrar na fórmula de vitaminas, suplementos, cosméticos e até ração animal. “A semente de açaí é apenas um caso de matéria-prima sustentável e inexplorada. Quantos outros não devem existir em nossa rica biodiversidade?”, indaga a pesquisadora do Instituto Nacional de Tecnologia (INT).

Ayla integra uma turma de quase 100 pessoas escolhidas para receber o incentivo do Instituto Serrapilheira, centro privado de apoio a pesquisas, cuja base funciona em um escritório em plena Rua Dias Ferreira, no Leblon. A entidade foi criada em 2017 pelo casal Branca Vianna, linguista e intérprete, e João Moreira Salles, documentarista, que durante dois anos visitou pesquisadores para entender como uma organização privada poderia contribuir de maneira efetiva para o avanço do saber. Nestes tempos em que recursos públicos para as ciências encolhem e inovar é condição básica para o desenvolvimento de qualquer país, iniciativas como essa, que driblam a escassez e alimentam talentos, são vitais.

No quartel-general do Serrapilheira (no dicionário: composto orgânico que aduba o solo), sete funcionários dão expediente — mas é lá fora, em todo o Brasil, que seus efeitos são mais visíveis, especialmente nas áreas de matemática, ciências naturais e computação. Felipe Ricachenevsky, biólogo da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, investiga espécies de arroz selvagem que absorvem ferro por meio de uma característica considerada, até então, exclusiva do arroz cultivado. Muito específico? Pois é de grão em grão (com o perdão do trocadilho) que o conhecimento vai sendo edificado nos mais diversos campos. Tiago Pereira, matemático da Universidade de São Paulo, criou uma teoria matemática que descreve comportamentos emergentes em redes complexas, como o cérebro humano. Aplicada aos computadores, pode ajudar a prever o momento em que doenças (como a epilepsia) vão surgir em um paciente saudável. Física da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Andreia Macedo desenvolveu emissores de luz com recorde de eficiência, trabalho publicado na revista Nature Photonics, que reporta estudos inovadores.

A maioria das iniciativas congêneres costuma ir à caça de profissionais experientes à frente de pesquisas aplicadas, geradoras imediatas de valor no mercado. No Serrapilheira, que tem estrutura financiada por um fundo patrimonial de 350 milhões de reais, é justo o contrário: os contemplados em doze estados e no Distrito Federal (com um aporte inicial de 100 000 reais) são em grande parte cientistas com não muito tempo de doutorado que esbarraram nos limites das agências de fomento. “Buscamos pessoas com capacidade de fazer grandes perguntas. Normalmente são as mais difíceis e, portanto, altamente competitivas”, explica o geneticista francês Hugo Aguilaniu, diretor-presidente da instituição. Enquanto no Brasil é dos cofres públicos que mais aflui o dinheiro para pesquisa, no exterior ele vem de vários centros no estilo do Serrapilheira, caso dos americanos Simons Foundation e Howard Hughes Medical Institute (HHMI).

No dia a dia, cada pesquisador do instituto fica na sua base, mas a cada seis meses o pessoal se reúne em animados encontros movidos a muito debate e troca de ideias em uma linguagem que só essa tribo mesmo entende. “Trata-se de um modelo ainda muito incipiente no Brasil, mas muito valioso”, destaca o físico mineiro Bruno Mota, de 42 anos, radicado no Rio há quase duas décadas. Seus estudos comparam a forma cerebral entre espécies diferentes, como ratos, elefantes e baleias, para encontrar uma regra universal (expressa pela matemática) capaz de diagnosticar morfologicamente doenças neurodegenerativas.

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Com o apoio financeiro, ele mapeou novos ângulos em sua investigação, emplacou três artigos em publicações renomadas, investiu em um laboratório próprio e criou uma rede de coleta de cérebros de mamíferos aquáticos. As boas-novas na vida dele e na de seus colegas destoam do que grande parcela dos jovens cérebros vem vivendo neste momento em que, passada a tesoura no orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia, muitos pesquisadores ficaram à míngua. Dos 13 bilhões de reais aprovados para 2020 na pasta, cerca de 40% estão contingenciados — ou seja, por ora não podem ser usados. Uma situação que impõe o desafio permanente de inventar alternativas. A experiência do Serrapilheira é prova de que em se plantando tudo dá.

O instituto em números

2017 é o ano da criação do Serrapilheira, no Rio de Janeiro

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350 milhões de reais foram destinados ao fundo que banca a iniciativa

22,6 milhões de reais já foram investidos em pesquisas nas áreas de matemática, ciências naturais e computação

95 pesquisadores de todo o Brasil foram contemplados com verbas

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