Escola Superior de Desenho Industrial agoniza com a crise da UERJ
Com salários dos servidores atrasados e sem receber verbas de custeio a instituição luta para manter as portas abertas
Na esquina da Rua Evaristo da Veiga com a Avenida República do Paraguai, praticamente ao lado dos Arcos da Lapa, um conjunto de prédios construídos no século XVIII para uso militar abriga a sede da Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Esdi). O ar espartano das instalações contrasta com as credenciais da instituição. Fundada há 55 anos sob a influência da escola Bauhaus, a meca do design na Alemanha, a Esdi é a pioneira no ensino da disciplina no país. Há dez anos, com base em sua excelência acadêmica, foi incluída pela revista americana de negócios BusinessWeek entre as sessenta melhores do mundo, a única na América Latina. O que deveria ser motivo de orgulho dos cariocas, no entanto, claudica em meio ao abandono para manter as portas abertas. Parte da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a Esdi sofre com a decadência da instituição-mãe e reflete mazelas como a redução das verbas de custeio e salários atrasados. Em um cenário desolador, com laboratórios e oficinas sucateados, como mostra a foto maior nesta reportagem, a entidade arrasta-se para manter-se aberta — há inclusive despesas pagas com dinheiro arrecadado pelos alunos. “Os servidores não têm vindo trabalhar e nossos estudantes ajudam na administração. Até mesmo o zelador é pago com renda proveniente de eventos do diretório acadêmico”, explica Zoy Anastassakis, diretora do curso, há um ano no cargo.
A reputação da Esdi foi construída sobretudo com base no rigor acadêmico da instituição. Enquanto a maioria das escolas de design brasileiras tem foco na abordagem artística, a Esdi se orientou pelo apuro técnico e científico aplicado ao desenvolvimento de produtos. Para manter esse padrão, a escola carioca sempre se pautou por contatos com instituições internacionais de primeira linha da Europa e dos Estados Unidos. Da mesma forma, mantinha parcerias com empresas para o desenvolvimento de produtos e estágios de estudantes. Hoje, sem recursos e semiarruinada, viu minguar tais programas — eles se resumem principalmente a um acordo com a Academia Real Dinamarquesa de Belas-Artes, em Copenhague, em um estudo sobre bibliotecas públicas e a tratativas com uma universidade da Croácia. “As oportunidades são esporádicas e pontuais, mas é óbvio que a situação precária em que nos encontramos dificulta essas iniciativas”, explica a diretora. “Infelizmente, minha prioridade acaba sendo manter a escola funcionando, tais são a decrepitude das instalações e o caos nas contas.”
De fato, uma recente tempestade inundou a diretoria da Esdi — a água jorrava do teto. O telhado e as instalações elétricas dos prédios estão arruinados. Para conseguir abrir uma portaria voltada para a Rua do Passeio, mais movimentada e segura que o endereço oficial, a administração pediu ajuda ao Banco Votorantim, que constrói um prédio no terreno vizinho e concordou em pagar a obra. “Fizemos um corte de 30% nas despesas, mas temos dívidas com as empresas terceirizadas do ano inteiro. E ainda nem sequer conseguimos cumprir nossos contratos para voltar às aulas”, alega o reitor da Uerj, Ruy Garcia Marques, que na semana passada não sabia se seria capaz de dar início às atividades, mesmo após o desastre de 2016, em que o segundo semestre foi totalmente desperdiçado, com alunos sem atividades e as instalações literalmente abandonadas às moscas.
Com 250 estudantes na graduação, 190 nas turmas de mestrado e doutorado e um corpo docente de 43 professores, a Esdi é venerada por seus ex-alunos. Um dos devotos é o designer Fábio Lopez, que desenvolveu as letras que estamparam a comunicação visual dos Jogos Olímpicos — a logomarca do evento, um desenho estilizado do Pão de Açúcar, é obra de outro egresso da instituição, Daniel Souza. “No fim dos anos 90, quando estudei lá, passamos por crises, mas nenhuma tão grave quanto a atual”, avalia Lopez. Até agora, a Esdi superou todos os seus problemas, que nunca foram poucos. A questão é saber se desta vez a respeitada escola da Lapa conseguirá sobreviver a tanto descaso e indiferença.