Nova milícia, lucro de R$ 100 milhões: detalhes de delação de Ronnie Lessa
Assassino confesso de Marielle Franco 'ensina' como grupos paramilitares agem para 'legalizar' terrenos invadidos
Na delação premiada homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Ronnie Lessa, assassino confesso da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, “ensinou” como paramilitares agem após invadir uma comunidade no Rio a fim de “legalizar” terrenos e evitar problemas com moradores e proprietários. Segundo Lessa, há um despachante conhecido como Geleia, cujo nome ainda não foi divulgado, que costuma fazer este serviço em 15 dias, pois teria acesso a cartórios. A vereadora teria sido morta a mando dos irmãos Domingos e Chiquinho Brazão por causa de problemas fundiários.
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“Ele é uma espécie de despachante. É um dos caras que faz a ‘legalização’ da grilagem. O que eu quero dizer com a legalização entre aspas? O Geleia simplesmente fala assim: tá pronto, já tem o projeto topográfico, o projeto do loteamento tá aqui, pronto. Pronto que eu digo é a nível de papel, os documentos ainda, tá? Antes de botar qualquer máquina. Então, para botar a máquina, já vamos fazer um documento? Vamos. Quanto vai ser isso? Aí ele vai cobrar o preço dele: R$ 50 mil, R$ 100 mil. É de acordo com o tamanho do terreno que ele vai te cobrar, vai te fazer o preço, tá? Ele tem os acessos, ele levanta tudo o que o senhor imaginar”, disse Lessa, conforme publicado pelo site g1. Trechos da delação foram mostrados em primeira mão pelo Fantástico, da TV Globo, neste domingo (26). Na ocasião, o ex-policial admitiu ter praticado o crime que resultou nas mortes de Marielle e Gomes. Em duas horas de depoimento gravado, Lessa fala quem são os mandantes, o que receberia pelo crime e o destino da arma usada em 14 de março de 2018.
“Então, se eu cismar de entrar numa terra hoje, e não houver resistência, em 15 dias eu já mando fazer um documento. Não tem resistência, ninguém apareceu. Primeira coisa, limpa o terreno; quando limpar o terreno, se existe um dono e ele não mandou limpar, esse dono vai mandar alguém ver: ‘Quem é que tá mexendo no meu terreno?’ Isso é óbvio. Então, quando você limpa, o primeiro passo da grilagem: limpou o terreno. Ninguém mexeu, ninguém botou a cara? Tu continua. Aí tu começa a botar cerca de arame farpado. Ninguém se manifestou? Tu já pode chamar o Geleia ou o Panaro. A atuação deles é muito maior ali, Muzema, Tijuquinha e Rio das Pedras”, completou o delator, que também chamou a atenção para a importância do trabalho de um topógrafo realize serviços como checar se o terreno é estável, se passa água embaixo e se há risco de deslizamento. O profissional também indica onde cavar as estacas de um imóvel, providencia nivelamentos e calcula muros de contenção. Ainda de acordo com Lessa, um homem a quem chama apenas de Belém no depoimento tem uma empresa legal de topografia e que, entre os clientes, estão criminosos. “Ele trabalha para todas as milícias. Gardênia é área de milícias ali de Jacarepaguá. Ele pode fazer um trabalho para mim lá em Angra, como pode fazer para uma empresa”, contou o ex-policial, em um dos pontos da delação.
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Nas investigações, a Polícia Federal (PF) conseguiu identificar Anderson Pereira Belém como o topógrafo que realizou os serviços praticados para Lessa. Belém não foi indiciado pela PF nem denunciado pelo Ministério Público. “Ele sempre trabalhou para a milícia. Todos os milicianos ali que queriam fazer um loteamento era com o Belém [que faziam o trabalho]. Porque, na verdade, ele era um profissional, ele vai trabalhar para todo … pra qualquer um. Qualquer pessoa que chamar ele vai fazer, ele vai dar a planta lá, ele vai … faz aquele … aquele, as plantas que são. O projeto em si, né? E entrega. A empresa dele é legal. Ele é um profissional liberal. Então ele faz rindo… Por quê? Porque ele tá ganhando o dinheiro dele e não quer saber pra quem tá fazendo. Ele quer fazer”, contou. No relatório, encaminhado ao STF, os investigadores descobriram que Lessa soube por Belém que o deputado federal Chiquinho Brazão estava convocando pessoas para uma audiência pública sobre regularização de condomínios irregulares e loteamentos no Rio de Janeiro.