Cesar Maia: “A humildade traz reconhecimento”

Com quatro mandatos como vereador, Cesar Maia simboliza a longevidade política no Rio, com um legado que atravessa gerações e grandes transformações urbanas

Por Redação VEJA RIO Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 4 jul 2025, 12h32 - Publicado em 4 jul 2025, 10h14
Cesar-Maia
Cesar Maia: "Tenho muito amor pelo Rio" (Dani Darcoso/Divulgação)
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Aos 80 anos e mais de meio século de vida pública, Cesar Maia segue firme em seu quarto mandato como vereador, ainda atento às demandas da cidade onde nasceu e construiu sua trajetória política. Pai de Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados, e da atual secretária de Turismo do Rio, Daniela Maia, é também avô de oito netos — e uma das figuras mais longevas da política brasileira.

Economista, ocupou cargos como secretário estadual de Fazenda, deputado constituinte, deputado federal e prefeito — período marcado por projetos como o Favela-Bairro, a reforma do Centro de Tradições Nordestinas, a construção da Cidade das Artes e a inauguração da Cidade do Samba. No Legislativo, segue ativo: é autor de leis como a que proíbe a venda de ultraprocessados nas escolas infantis e fundamentais do município.

Em entrevista à VEJA RIO, ele revisita momentos-chave da carreira, reflete sobre seus maiores desafios e conta o que o move a continuar essa trajetória.

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O senhor cresceu em uma família de servidores públicos. De que forma isso influenciou sua escolha pela carreira política? Comecei com doze anos escrevendo em casa cadernos sobre suas experiências no serviço público. Meu pai, que foi técnico do Ministério do Trabalho, relatava em detalhes as viagens que fazia para fiscalizar sindicatos em diferentes partes do Brasil. Lembro que falava sobre como o comportamento dos trabalhadores mudava de estado para estado. Esse convívio me formou como alguém interessado na área pública. E, na faculdade, me tornei um ambiente estudantil bastante politizado, em plena ditadura militar.

O período da ditadura militar foi bastante duro e, no seu caso, resultou em algumas prisões e, depois, no exílio no Chile. Como foi esse capítulo da sua vida? Eu era filiado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e fui preso algumas vezes, por períodos curtos. Mas fiquei preso por uns três meses logo após o Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em Ibiúna, em 1968. Depois disso, meus pais decidiram que eu deveria sair do país. No exílio, estudei economia na Universidade do Chile, conheci e me casei com minha esposa, Margareth, e tivemos os meus dois filhos gêmeos, Rodrigo e Daniela. Lembro até hoje os nomes das ruas onde moramos. Foi o começo de uma nova vida.

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O senhor retornou ao Brasil em 1973, vindo direto do Chile, que tinha ido após a queda do presidente chileno Salvador Allende. Como foi a volta ao país e o início da sua relação com o ex-governador Leonel Brizola? Ao retornar, fui preso novamente por três períodos curtos, investigado por ter pertencido ao PCB. Mas logo comecei a escrever sobre economia em jornais. A proximidade com Brizola veio mais tarde, quando ele voltou do exílio no Uruguai, se elegeu governador e me chamou para ser secretário de Fazenda. A gente tinha uma boa afinidade política e econômica. Como não achava os discursos dele muito bons, passei a preparar textos curtos sobre os municípios que ele visitaria em campanha, com informações básicas sobre cada lugar. Assim começou nossa parceria.

Durante o mandato de Leonel Brizola, o senhor assumiu cargos importantes, como secretário de Fazenda, e ganhou bastante reconhecimento. Como foi sua passagem depois pelo Legislativo e sua primeira candidatura à Prefeitura do Rio? A ideia foi do próprio Brizola. Ele achava que eu deveria disputar uma vaga na Câmara dos Deputados. Acabei sendo o deputado federal mais votado do PDT em todo o Brasil e fui eleito também uma segunda vez. Depois, me candidatei à prefeitura com o apoio do Doutor Ulysses Guimarães, do PMDB. Eu não via sentido nisso. Lembro de quando fui à Casa dele e ele falou: “Cesar, sua missão é chegar em terceiro lugar. Você não tem o compromisso de vencer”. Mas, por uma diferença muito pequena de votos, acabei vencendo.

O senhor foi prefeito por três mandatos — dois consecutivos — e esteve entre os que mais tempo passaram à frente da cidade. Quais foram os maiores desafios nesse período? Acredito que os maiores desafios foram relacionados à urbanização e à ordem pública — assumi essa responsabilidade. Durante minha gestão, nasceram dois grandes projetos: o Rio-Cidade e o Favela-Bairro. Um voltado para a ordenação de cada bairro carioca, conduzido por Luiz Paulo Conde, com projetos assinados por grandes arquitetos do Brasil. E outro focado nas favelas, coordenado pelo arquiteto Sergio Magalhães e financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Nas comunidades, levamos creches, construímos escolas, colocamos asfalto, calçamento, melhoramos o saneamento… Não uma época em que ninguém entrava nesses locais.

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Qual o senhor diria que foi sua marca principal na Prefeitura? Diria que a principal marca foi ser reconhecido como um bom gestor. Até hoje, quando faço campanha para vereador, tem gente que me encontra na rua e diz: “Você foi um grande administrador!”. E eu agradeço. É difícil dizer, mas, sinceramente, me orgulho de que fiz termos de urbanismo e ordem urbana, os programas que implementei foram bem-sucedidos.

O senhor é um dos nomes mais longevos da política brasileira. O que o motiva a continuar na vida pública? E por que decidiu seguir como vereador, agora no quarto mandato? É algo natural. Nas duas últimas eleições para vereador, fiz praticamente toda a campanha pelo computador, porque já não tinha mobilidade para andar pelas ruas. Mas fiz tudo aqui, do escritório, com prazer. Candidatei-me também ao Senado, em 2010, e quase ganhei, perdi por muito pouco. Hoje, sinceramente, agradeço por isso. Ir para Brasília teria sido um sacrifício. Tenho muito amor pelo Rio. Durante minhas campanhas políticas, passai por todos os bairros, subi todas as favelas, na época, com muito vigor. É o meu lugar de vida.

Como funciona sua rotina hoje? Acordo cedo, tomo café por volta das 5 horas e logo depois pego o jornal. Me mantenho atualizado assistindo aos noticiários de TV e também recebo muita coisa pelo celular. As pessoas mandam mensagens e eu respondo a todos, com prazer. Hoje é muito mais simples acompanhar as demandas da cidade. Continuo muito ligado às questões de urbanização, como na época em que estive à frente da prefeitura. Em razão da mobilidade, vou menos à Câmara presencialmente, mas participo de forma virtual todos os dias. E à noite, quando tem jogo de futebol, fico acordado até tarde para torcer — sou botafoguense, como meu filho e meu neto.

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E, entre os problemas do Rio, qual considera o mais urgente hoje? Sem dúvidas, a segurança pública. É o maior desafio. Vemos a cada semana o Eduardo Paes enfrentando um desafio grande, com a implementação de mudanças na Guarda Municipal. Espero que dê certo, mas não vai ser fácil.

A cidade tem ganhado protagonismo por receber grandes eventos, principalmente agora com o projeto Cidade do Mundo no Rio, que trouxe as cantoras Madonna e Lady Gaga. Quais eventos marcaram sua trajetória como prefeito? Foram muitos. Um dos mais marcantes foi o show dos Rolling Stones. Na época, os produtores procuravam diretamente a prefeitura para viabilizar esses grandes eventos. Fui o primeiro a realizar shows na praia no Réveillon. A ideia era esvaziar a praia aos poucos, depois da queima de fogos. Funcionou. Shows de Jorge Ben Jor, Tim Maia, Rod Stewart, com ordem de polícia, marcaram época. A descentralização das festas também foi uma ideia que surgiu naquele período, fazer o Réveillon em outros bairros além de Copacabana.

O senhor se vê como inspiração política dentro da sua própria família? Sim, e isso me enche de orgulho, como um ciclo que cede. Ele foi secretário do prefeito Luiz Paulo Conde no final dos anos 1990, depois presidiu a Câmara. Hoje está em São Paulo, presidindo a Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF). Está muito bem. E minha filha, Daniela Maia, seguiu como secretária de Turismo do Rio, incentivando os eventos e a valorização dessa cidade que tem tanto potencial.

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Depois de tudo que viveu na política, se pudesse voltar no tempo, que conselho daria a si mesmo? Ter humildade. Os políticos mais consagrados, que deixaram um legado, foram os mais humildes. A humildade é que traz reconhecimento e integração com as pessoas.

Hoje, com 80 anos e meio século de trajetória política, como o senhor gostaria de ser lembrado? Como um homem que foi vereador muito mais por missão do que por status. Fico feliz em receber homenagens em vida e tenho orgulho dessa trajetória.

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