Versatilidade é uma característica básica para qualquer ator que queira se firmar na carreira. Mas há um grupo de profissionais que tem levado tal conceito ao extremo, trocando de personagem, peça e teatro em questão de horas. João Velho é um deles. Como o protagonista de Joaquim e as Estrelas, ele se apresenta aos sábados e domingos a partir das 4 da tarde no Imperator, no Méier. Horas depois, assume a persona do poeta Arthur Rimbaud (1854-1891) em Eu É um Outro, no Teatro Poeirinha, em Botafogo. Deslocar-se da Zona Norte à Zona Sul e passar da história infantil à densidade da obra adulta tem sido rotina para ele no último mês, quando a montagem destinada ao público mirim voltou a ser encenada em curta temporada. Velho precisou até fazer mudanças no visual. A volumosa barba, cultivada por meses para compor o visual de Rimbaud na produção levada aos palcos em julho, teve de sair de cena. “Foi uma surpresa voltar a fazer Joaquim e as Estrelas, justamente quando o outro espetáculo já estava em cartaz. É um desafio enorme porque um papel não tem nada a ver com o outro”, diz Velho.
Na tarefa de encarnar dois personagens ao mesmo tempo sobra stress, principalmente quando o intervalo entre as duas apresentações é curto. Paulo Mathias Jr. chega ao Teatro Maria Clara Machado, na Gávea, por volta das 14 horas todos os domingos. As cortinas de Leonardo – O Pequeno Gênio da Vinci se abrem às 16 horas e fecham setenta minutos depois. Entre posar para fotos com a plateia e voltar ao camarim e trocar o figurino pela roupa normal passa-se mais meia hora. Ele então pega um táxi até o Theatro Net Rio, em Copacabana, onde encena o monólogo O Cara, às 19 horas. “Fico tão tenso que acompanho o relógio minuto a minuto”, comenta. Para transitar do grande artista do Renascimento ao jovem viciado em trabalho sem risco de curto-circuito, Mathias Jr. adota um truque. “Fico me olhando no espelho com o figurino. Não sei por quê, mas facilita a concentração e me ajuda a focar a peça”, conta.
Quem vive a jornada teatral dupla costuma dizer que pior que a correria de um teatro para o outro é a fase de ensaios. Principalmente pelas laudas e laudas de diálogos que devem ser decorados concomitantemente. “Quase enlouqueci com a pressão de receber dois textos ao mesmo tempo. Durante duas semanas, dormi só quatro horas por noite”, lembra Erom Cordeiro. Atualmente, o ator interpreta o arpoador Ned Land na montagem infantil Algumas Aventuras das 20?000 Léguas Submarinas e o cabeleireiro Milo Tindolini no suspense Em Nome do Jogo. Como se não bastasse, ele ainda participa da novela das 6 da TV Globo, Amor Eterno Amor, como o vaqueiro Tobias. “O que me move é o desafio de estar em projetos bacanas, nos quais acredito. Se for o caso, topo fazer um esforço extra e me divido entre vários personagens”, explica. O público, claro, aplaude.