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Astrônomas cariocas pesquisam na Nasa vulcões espalhados pelo espaço

Fabíola Magalhães e Rosaly Lopes venceram a discriminação de gênero e outras dificuldades para alcançar o sucesso acadêmico na Califórnia

Por Saulo Pereira Guimarães
Atualizado em 2 jun 2017, 12h29 - Publicado em 22 ago 2015, 01h00

Muita gente confunde astronomia (ciência que estuda os corpos celestes) com astrologia (arte de desvendar o futuro por meio das estrelas) ou mesmo gastronomia (área que abrange os prazeres da culinária). Quem faz essa afirmação, após dar boas risadas, é Fabíola Magalhães, 33 anos, nascida e criada na Ilha do Governador, Zona Norte da cidade. Ela tem conhecimento de causa sobre o que diz, afinal, trabalha desde o ano passado na National Aeronautics and Space Administration, a popular Nasa. Finaliza um doutorado em geofísica espacial no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (o Inpe, de São José dos Campos, São Paulo). O curso inclui a experiência de um ano, patrocinada pelo programa Ciência sem Fronteiras, no JPL (sigla em inglês para Laboratório de Propulsão a Jato), um dos centros de estudos da agência espacial americana, na cidade de Pasadena, na Califórnia. A façanha dessa ilhoa que na adolescência devorava os livros do astrônomo Carl Sagan não é coisa pequena. Fabíola vem se projetando num meio que não costuma receber bem as mulheres.

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Levantamento divulgado no mês passado por pesquisadores ligados ao Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e à Universidade de São Paulo (USP) indica que há uma discriminação de gênero nos laboratórios de astronomia brasileiros: 36% das cientistas disseram ter sofrido assédio sexual no trabalho; e elas respondem por só 28% das cadeiras na Sociedade Brasileira de Astronomia (veja o quadro ao lado). O curioso é que Fabíola é orientada justamente por uma mulher, também carioca (de Ipanema): Rosaly Lopes, 58 anos.

Preconceito
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Rosaly chegou a cursar o primeiro período de astronomia na UFRJ, mas concluiu seus estudos na Inglaterra, chegando a bater ponto no Observatório Real de Greenwich. Após trabalhar em Nápoles, na Itália, foi chamada pela Nasa, em 1991. Hoje a astrônoma comanda o núcleo de Ciências Planetárias do JPL, com 100 profissionais sob sua supervisão. Há um dado interessante em seu currículo: ela é a pessoa que descobriu a maior quantidade de vulcões em atividade, conforme está registrado na edição de 2006 do Guinness Book. Foram 71, e todos eles estão localizados em Io (pronuncia-se “Ío”), um dos satélites naturais de Júpiter. E é sobre isso a tese da pupila Fabíola.

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As duas se debruçam sobre um tema complicado, árido para quem não é do ramo. Localizado a 800 milhões de quilômetros da Terra, Io é pouco maior que a nossa lua. Tem 4,5 bilhões de anos de idade e se destaca por ser o corpo celeste mais avermelhado do sistema solar. Io está no meio de um cabo de guerra entre Júpiter e seus outros satélites. O efeito gravitacional deles acaba fazendo com que a superfície do satélite fique num estica e puxa permanente. E essa movimentação termina gerando calor e resulta em vulcanismo. O estudo vai além. Essas erupções expelem partículas que a atmosfera de Io não tem como segurar e que, por isso, acabam escapando para o espaço. Elas formam um cinturão de matéria ao redor de Júpiter, também conhecido como toroide de plasma. O que Fabíola quer entender é como a atividade vulcânica de Io afeta essa estrutura. “Quanto mais soubermos sobre isso, melhor compreenderemos o sistema como um todo”, resume a cientista.

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O que ela pesquisa
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Fabíola tem até o começo de março do ano que vem para retornar ao Brasil, onde deve apresentar sua tese de doutorado até o fim de maio. A experiência no JPL ajuda (mas não resolve) seu futuro por aqui. Por exemplo, não é garantido que a moça tenha um laboratório no Inpe quando voltar. Mais certo é que terá de conseguir uma bolsa para continuar pesquisando, ou para tentar obter uma vaga numa instituição que lhe permita dar prosseguimento a seus trabalhos. Outro desafio será fazê-los sem a infraestrutura da Nasa. O Brasil não tem tradição no setor, e sintoma de que as pesquisas andam rareando por aqui foi o rompimento, em julho, da parceria com a Ucrânia para o lançamento de foguetes. O lado bom dessa história é que Fabíola trará na bagagem a experiência de ter trabalhado num laboratório de ponta e, principalmente, de ter acompanhado a forma como ele é gerido. A cientista que foi para os Estados Unidos como aprendiz voltará como pioneira num assunto praticamente inexplorado por aqui. Ela não para. É uma carioca agitada como os fenômenos que estuda.

(Correção: diferentemente do que consta na versão impressa, Io é pouco maior que a nossa lua e não Júpiter, como foi publicado)

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