Copa, cozinha e vinho
Texto FABIANA GITSIO, harmonizações MARCELO COPELLO BACO nunca perde a oportunidade de erguer a taça. Desta vez, demos um giro pelas 12 cidades-sede da Copa do Mundo para buscar os pratos mais representativos destas capitais. Depois, é claro, escolhemos o vinho perfeito para cada uma das receitas. Nossa escalação de sabores reúne nomes consagrados ou […]
Texto FABIANA GITSIO, harmonizações MARCELO COPELLO
BACO nunca perde a oportunidade de erguer a taça. Desta vez, demos um giro pelas 12 cidades-sede da Copa do Mundo para buscar os pratos mais representativos destas capitais. Depois, é claro, escolhemos o vinho perfeito para cada uma das receitas. Nossa escalação de sabores reúne nomes consagrados ou “exóticos” e mostra a diversidade da nossa gastronomia.
Para não embolar o meio de campo, foi preciso respeitar as diferenças. Em Belo Horizonte, nossa estratégia foi identificar uma matéria-prima comum. Com tutu de feijão, frango com quiabo, leitão à pururuca e um vasto etcétera em contribuições, seria impreciso escolher um único prato. Driblamos escolhendo um talento que jogasse em todas as posições. Fomos ouvir os causos do Xapuri, o restaurante-ícone pertinho do estádio do Mineirão. Comandado pelo chef Flávio Trombino, a cada semana ali são servidos 250 quilos só de costelinha. Logo identificamos que é o porco o “mineirinho de cabo a rabo”. Mesmo quando não vai à mesa, é quase certo que uma gordurinha suína tenha caído sobre as maravilhas da cozinha mineira: assados ou frituras; guisados ou ensopados, em sopas, molhos ou farofas. Com base nesse polivalente, selecionamos uma receita.
Saímos do impasse e logo outro surgiu. Brasília tem um cardápio nacional – é o churrasco consumido com tanta avidez que arranca “bahs” do mais genuíno espanto gaúcho; é a feijoada de todos os sotaques; é o pão de queijo que vende mais que em BH e por aí vai… Mas a cidade ainda é jovem demais para ter um prato para chamar de seu. Apontar o arroz de pequi goiano, por mera questão geográfica, seria fazer corpo mole (a receita nem é muito apreciada no Distrito Federal). Voltar ao passado, a uma ou outra iguaria amada pelo presidente JK seria “catimbar”, atrasar o jogo. Insistir na buchada de bode porque alguns políticos adoram, só nos serviria para levar cartão amarelo do leitor. Fizemos a “finta” e apelamos à receita-ícone do Piantella, seu restaurante mais emblemático.
Nossa seleção de pratos e vinhos está show de bola.
PIRARUCU DE CASACA
Manaus e a versão brasileira da bacalhoada
O Pirarucu de casaca, ou à casaca, é o mais sofisticado entre os pratos com “a cara de Manaus”, identificados pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes. Depois de salgado e cozido, o peixe é cortado e desfiado para inaugurar o tabuleiro que receberá 4 camadas: farofa de manteiga e farinha de mandioca; salada; banana frita; batata palha. O que sai do forno é capaz de deixar a bacalhoada constrangida.
Harmoniza com um Chardonnay da Serra Catarinenense-SC, como o Chardonnay da Villa Francioni.
MOJICA DE PINTADO
Tradição e delicadeza em Cuiabá
A Mojica de pintado é o ensopado de peixe e mandioca, mais tempero verde, tomate e cebolinha. Prato de delicadeza ribeirinha, servido com banana-da-terra.
Harmoniza com um espumante Moscatel da Serra Gaúcha-RS, como o Moscatel da PERINI
CARRÉ DE CORDEIRO COM RISOTO TRUFADO
Brasília e o prato capaz de apaziguar rivais
Nossa escolha é o Carré de cordeiro ao molho de ervas finas com risoto trufado, o clássico do Piantella. O restaurante reúne adversários políticos desde 1977 e tem credenciais de sobra para acalmar também as paixões do futebol.
Harmoniza com um Barbera de Goiás, como o Barbera Bandeiras, da vinícola Pireneus.
BAIÃO DE DOIS
Em Fortaleza, a versão mais saborosa de um clássico
O Ceará criou a versão mais temperada de uma querida combinação brasileira. Baião de dois é o encontro do arroz branco com o feijão de corda (chamado feijão fradinho e feijão verde), mais carne seca frita na manteiga de garrafa, queijo coalho, cebola, calabresa e toucinho. Acompanha farinha de mandioca e pimenta. Em Fortaleza, o baião circula da barraca da praia a restaurantes como o Colher de Pau. E ainda faz uma “fezinha” nos botecos.
Harmoniza com Merlot da Serra Gaúcha-RS, como o Desejo Merlot da Salton
CAMARÃO COM CARNE DE SOL
Sertão e mar vão à mesa em Natal
A comida típica de Natal não pode ser explicada só pelo sertão, com carne-de sol, macaxeira, jerimum, tapioca e “paçoca” (de amendoim não tem nada). O Rio Grande do Norte o é segundo produtor nacional de camarão. Nossa receita, faz justiça às duas forças. Camarões graúdos são refogados com manteiga do sertão, nata fresca, cebola roxa, pimentão vermelho, coentro e queijo de coalho assado em cubos. Acompanham arroz cremoso e macaxeira frita com recheio de côco. A sugestão é do Grupo Camarões.
Harmoniza com um Pinot Noir de Campos de Cima da Serra-RS, como o RAR Pinot Noir da Miolo
ESCONDIDINHO
A simpatia de um típico pernambucano
A deliciosa crosta crocante que sai do forno destaca o prato montado em camadas. A receita original leva carne seca cozida na manteiga de garrafa, purê de macaxeira e é finalizada com queijo coalho. O escondidinho nasceu em Pernambuco, fez-se popular no Nordeste e alcançou outras regiões do Brasil, com variações. Este é da Oficina do Sabor.
Harmoniza com um Syrah do Vale de São Francisco-PE, como o Rio Sol Syrah
ACARAJÉ
Keep calm e… Prove o bolinho das baianas
Em tempos de quotes, é só para lembrar que ninguém pode dizer que esteve em Salvador sem ter provado um acarajé. Servido na rua pelas baianas de tabuleiro e nos restaurantes, o quitute é bem mais conhecido que o slogan “Sorria, você está na Bahia”. Nem todos se animam ao bolinho com base de feijão fradinho, frito em azeite de dendê e recheado de vatapá, camarão seco e vinagre. Os cautelosos podem escolher a versão sem pimenta. Embora também seja “porreta” apimentar um bocadinho mais…
Harmoniza com um espumante Brut do Vale dos Vinhedos-RS, como o Cave Geisse Brut Nature
LOMBO ASSADO NA PANELA
Belo Horizonte e o ‘mineirinho’ que trabalha pelo sabor
Na cozinha mineira, o porco sempre está. O Lombo assado na panela segue como estrela do Xapuri, cujo comando foi passado de mãe para filho. O novo chef Flávio Trombino introduz novidades como a sobremesa Brazuca, homenagem à bola da Copa, e o Torresmo de barriga. Mas o faz com a cautela típica e mantém os clássicos de dona Nelsa, que se aposenta após fazer do Xapuri o maior case de comida regional brasileira.
O lombo harmoniza com um Syrah de Minhas Gerais, como o Primeira Estrada Syrah
FEIJOADA
No Rio, a preferência nacional
Nosso primeiro clássico é conhecido até no exterior. Apesar das variações em solo nacional, a receita que prevaleceu é a do Rio. O caldo de feijão preto ganha, na panela, carne seca, paio, linguiça, lombo, costelinha, pé, orelha e rabo de porco. Servida com arroz, rodelas de laranja, farofa, torresmo, mandioca frita e couve picadinha. O prato chegou pelas mãos dos portugueses que usavam feijão branco, e aqui foi adaptado como alimento de escravos. A feijoada carioca ficou conhecida, primeiro, no restaurante G. Lobo, fechado em 1905. Mas ficou popular pelas vias do samba.
Harmoniza com Tannat da Campamha Gaúcha-RS, como o Tannat Vinhas Velhas da Miolo
PIZZA
O prato que é a cara de São Paulo
A cada dia a cidade devora 1 milhão e 400 mil pizzas, atrás só de New York. São 6 mil pizzarias, quase todas com delivery. A receita paulistana mais famosa é a Pizza de frango com catupiry criada em 1981 pela Margherita.
Harmoniza com um Sangiovese da Serra Catarinense-SC, como o Michelli Sangiovese da Villa Francioni
BARREADO
Curitiba e o fervor da panela de barro
O barreado é uma mistura de carnes bovinas, cozidas lentamente em panela de barro vedada com farinha e água. O pirão é servido com banana, arroz e laranja. O mix substancioso (temperado com tomate, cebola, alho poró, noz moscada, pimenta do reino e vinagre de vinho) teria sido criado por caiçaras carnavalescos no pós-folia. O barreado é o principal chamariz da litorânea Morretes. A Casa da Mãe Joana, no Batel, tem o prato no cardápio
Harmoniza com um Tempranillo do Paraná, como o Extrus Tempranillo da vinícola Dezem
CHURRASCO
Em Porto Alegre, carnes devem atrair tanto quanto o futebol
Na capital gaúcha, o sistema de bombacha, bota e espeto divide a atenção com um excelente circuito à la carte. Sabor e maciez por quem entende, em carnes de boi, porco, carneiro e galeto. O espeto vai rodar também na Saci, a churrascaria do estádio Beira Rio que recebe os jogos.
Harmoniza com um Cabernet Sauvignon da Campanha Gaúcha-RS, como o Aurora Cabernet Sauvignon Millésime
Marcelo Copello (mcopello@simplesmentevinho.com.br)