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Uma conversa com o iraniano Nassim Soleimanpour, autor de Coelho Branco, Coelho Vermelho, atração no Tempo_Festival

Um ator sobe ao palco para encenar um monólogo cujo texto só lhe é entregue no momento em que ele se encontra diante da plateia. Não há, portanto, nenhum tipo de ensaio, assim como não existe a figura do diretor. Nem os pouquíssimos elementos de cena que adornam o palco chegam a dar uma pista do […]

Por rafaelteixeira
Atualizado em 25 fev 2017, 18h52 - Publicado em 14 nov 2013, 20h00

Um ator sobe ao palco para encenar um monólogo cujo texto só lhe é entregue no momento em que ele se encontra diante da plateia. Não há, portanto, nenhum tipo de ensaio, assim como não existe a figura do diretor. Nem os pouquíssimos elementos de cena que adornam o palco chegam a dar uma pista do que se trata o enredo. O que não significa que seja uma peça de improvisação — afinal, há um texto, ainda que ele seja lido pela primeira vez ali mesmo, diante do público. Trata-se, em suma, de uma orientação explícita do autor: o ator em questão não pode ter qualquer conhecimento da história. Assim, cada apresentação demanda um novo intérprete. Há outro detalhe: em vez de serem instruídos a desligar seus celulares, os espectadores são informados do endereço eletrônico do autor e estimulados a escrever para ele durante a encenação.

Concebido pelo iraniano Nassim Soleimanpour, então com 29 anos, esse insólito projeto, batizado como Coelho Branco, Coelho Vermelho estreou em agosto de 2011, simultaneamente em dois festivais: o Fringe, de Edimburgo, e o Toronto SummerWorks. Desde então, têm cumprido uma trajetória meteórica: foi traduzido para mais de quinze idiomas e apresentado em diversos países, dos Estados Unidos ao Egito, da Inglaterra à Grécia, da Holanda ao Brasil (neste ano, em São Paulo). Até bem pouco tempo, porém, o próprio autor jamais assistira a qualquer dessas encenações. O texto não fora montado no Irã, e Soleimanpour estava proibido de deixar o país por ter se recusado a prestar o serviço militar. Só em fevereiro deste ano, diagnosticado com um problema de vista, obteve dispensa e pôde viajar para ver sua obra no palco, na Austrália.

Não há como falar muito sobre o texto sem contrariar a orientação de Soleimanpour — e, de alguma forma, comprometer a plenitude da experiência. Mas dá para dizer que a própria opressão vivida pelo autor, impedido de sair de seu país, serviu de inspiração para o texto, que fala sobre obediência, autoritarismo e censura. Se você está muito curioso, posso adiantar que há um coelho na história. E mais não digo. “Não posso dizer nada sobre a trama. Somente que é um texto lúdico, mas também forte e necessário”, diz Cesar Augusto, um dos criadores e curadores do Tempo_Festival, que receberá duas encenações da peça na semana que vem: na terça (29) e na quarta (20), às 20h, no Oi Futuro Flamengo. A primeira apresentação será com a atriz Lília Cabral e a seguinte, com Fábio Porchat.

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Eu conversei com Soleimanpour por e-mail sobre a peça. Confiram:

De onde veio a ideia desse texto?

Uma peça pode ficar tediosa depois de algumas apresentações. Eu sempre fui mais de ensaios. Eles são repletos de acontecimentos novos. Além disso, quando decidi escrever Coelho, eu não tinha um passaporte. Então, eu achei que poderia usar essa situação e escrever uma peça sem diretores e sem ensaios.

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Qual foi o seu objetivo ao criar uma peça que deve ser encenada a cada sessão por um ator diferente, sempre conhecendo o texto na hora?

É uma jornada, tanto para os atores quanto para a plateia. Eles vão descobrindo isso juntos. A própria história serve como estrutura. Você não quer que eu estrague a surpresa para seus leitores, quer?

Não há nada que você possa contar do texto?

Acho que não. Se eu pudesse contar essa história de uma forma melhor, não hesitaria nem por um segundo. A melhor história sobre a peça é a própria peça.

Como a situação política do Irã se relaciona com o conteúdo da peça e com a forma que você escolheu para encená-la?

Não muito diretamente. Obediência e autoridade são fenômenos globais. Eu estava em São Paulo quando os protestos começaram na Avenida Paulista. Dá para sentir como essa peça pode se relacionar com o que estava acontecendo nas ruas.

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A peça não tem diretor. Como isso funciona? Todas as indicações para o ator estão no texto?

Sim. Sem cenografia, sem diretor, sem ensaio. Atores e plateia são dirigidos através da leitura conjunta do texto.

E a ideia de dar seu e-mail aos espectadores para que eles lhe escrevam, qual é o objetivo?

Essa é a premissa da peça, conectar tempo e espaço. É ótimo que a plateia seja formada por escritores e eu me torne leitor deles. É ótimo como trocamos de papéis e conhecemos outras fronteiras.

Como os atores reagem, normalmente, à ideia de encenar um texto que só conhecerão no palco? Há muitas recusas?

Normalmente, eu não convido os atores e nem os conheço pessoalmente. Centenas já encenaram Coelho até hoje, e a maioria se dedicou às suas apresentações.

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Algumas críticas dizem que o fato de o ator não conhecer o texto previamente torna a voz do autor, a sua voz, mais presente em cena. Qual é a sua opinião sobre isso?

É assim que todos nós ficamos mais presentes: um misterioso encontro entre o ator, a plateia e o autor. Acho que todas essas vozes se tornam mais presentes, nesse sentido.

Considerando que cada apresentação tem um ator, a peça muda significativamente de uma sessão para outra? O quanto o estilo do autor interfere no tom da peça?

Sim, muda. A base está lá, enquanto os detalhes mudam inacreditavelmente. Atores e plateias diferentes criam uma nova abordagem para uma estrutura constante. A história é sempre a mesma. Mas roteiros se tornam algoritmos. Sentenças se tornam fórmulas. Plateia se torna ator. Atores se tornam plateia. E nós conhecemos a história de uma maneira nova a cada noite.

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