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Por Patrícia Lins e Silva, pedagoga
Educação
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Construir valores

Na escola, aprende-se que só o diálogo e bons argumentos são capazes de persuadir e de possibilitar o convívio razoável

Por Patricia Lins e Silva Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
8 dez 2020, 11h14

          Trabalhei com uma professora brilhante, a filósofa Circe Vital Brazil, que se foi muito cedo, e de quem eu gostava imenso. Estou sempre a me lembrar dela, da sua inteligência rápida e arguta, aliada a um humor delicioso. Um dia, nos idos do século passado, estávamos a conversar no pátio da escola num intervalo entre aulas. Especulávamos sobre qual seria o principal estranhamento da geração adulta que chegaria à virada do milênio com seus filhos jovens. Partíamos do princípio de que toda geração tem algum embate importante com a seguinte. E todos palpitávamos, tomando um café.

      “Violência”, apostei eu, “aceitarão a violência como natural”. “Ignorância, dizia outra, ninguém mais lê nada”. E a campainha interrompeu nossas digressões nos chamando de volta às salas de aula. Íamos caminhando quando, já longe, a Circe gritou “Valores”! Nunca me esqueci disso. À época não concordei, achei que já tínhamos ultrapassado as questões de valores, nada nos chocaria. Hoje percebo que nunca esqueci por

que ela tinha razão.

      O tema me veio à cabeça ao recordar o período recente das campanhas eleitorais. Assistimos a debates sem argumentos, candidatos sem programas, ataques sem provas, ofensas, e raras pessoas com preparo para representar a população nos rumos da cidade. E agora com a internet, tudo se propaga muito rapidamente, mesmo mentiras as mais absurdas. Acontece um esgarçamento de valores, difícil de determinar se é entre eras, crenças, gerações, grupos. Mentir, por exemplo, deixou de ser problema. E não é mentir para defender alguém, para proteger. É inventar histórias e fatos sem qualquer relação com a realidade para prejudicar alguém. E quem difunde a mentira, caso denunciado, sequer fica constrangido ou tenta justificar. Ser considerado mentiroso não é mais uma humilhação.

      Assisti recentemente a um vídeo na internet, em que um senhor, que se apresenta como intelectual e professor, manifestava grande fúria contra uma jornalista; mas sua fúria se expressava apenas por xingamentos. Não utilizou um único argumento. E não se envergonhou de ver sua figura espalhada pelo mundo a dizer uma plêiade de palavras do chamado baixo calão. Insultar abertamente não tem mais importância, deixou de ser problema.

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      Essas atitudes estimulam violência e comportamentos truculentos. A ignorância não permite um debate inteligente, porque argumentar exige conhecimento e reflexão.

      Como as gerações mais jovens estarão interpretando tudo isso? Percebem a dimensão dos ataques, dos vitupérios, da ignorância, das mentiras? Entendem que não é o comportamento que se espera de pessoas que frequentam escolas, de pessoas que se educaram?

      A escola é o lugar para os jovens discutirem essas questões. Mentiras, as possíveis consequências da distorção da realidade, o retrocesso civilizatório que é agredir fisicamente ou com insultos quando não se concorda com alguém, todos são bons temas para debates. Na escola, aprende-se como debater, como contestar; percebe-se que insultos vazios só expressam agressividade, e que só o diálogo e bons argumentos são capazes de persuadir e de possibilitar o convívio razoável.  

      A espécie humana possui a capacidade de pensar, que leva a refletir, raciocinar, aprender, argumentar. À escola compete provocar o uso dessa capacidade e discutir valores com os alunos para que aprendam que violência e ignorância não levam a um mundo melhor.

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