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Blog do novelista Manoel Carlos
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Presente de casamento

Leia na crônica de Manoel Carlos

Por Manoel Carlos
Atualizado em 27 out 2017, 17h43 - Publicado em 22 out 2017, 11h39

Rubinho é um novo e já querido companheiro das rodadas de queijos e vinhos do café Severino. Naquela tarde ele discutia com a mulher, a Tita, sobre um presente de casamento que mandariam entregar na Gávea, no apartamento de um casal de amigos. A discussão esquentava de vez em quando, o que me deixava sem graça diante do olhar curioso de algumas pessoas, atraídas uma ou outra vez em que o tom das vozes subia. A tarde estava chuvosa, o café com poucas pessoas, algumas até cochilando diante do jornal aberto sobre a mesa.

Aprendi, desde cedo, que em briga — ou mesmo uma mera discussão — entre marido e mulher não se deve meter a colher. Então, fiquei na minha.

— Você ficou de comprar o presente — dizia ele.

— É claro, você não sabe o que comprar.

— Caramba, um isqueiro de mesa, de prata, não é uma boa ideia? Sabe o preço, sabe?

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Ela ria, debochada e raivosa.

— Não seja ridículo, um isqueiro de presente de casamento? Para começar, nenhum dos dois fuma!

— O Nestor está deixando de fumar. Reduziu, reduziu bastante, mas ainda dá suas tragadas depois do jantar.

— Pior ainda! Ele lutando para se livrar do vício e você impedindo! Forçando a barra, levando o amigo para o mau caminho! E, além do mais, fumar saiu de moda. Isqueiro é um objeto ob-so-le-to!

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— Deixe de ser boba! Aquele isqueiro é um luxo, sempre sonhei com ele em cima da mesa de pôquer.

— Você está por fora. Se der o isqueiro, complete a boa ação: dê junto um pé de maconha. E compre o kit para você também.

Foi quando o Rubinho se levantou da cadeira, indignado:

— Não seria uma má ideia. Aguentar você doze anos é dose pra leão! Só drogado!

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— Onze — corrigiu ela. — Onze anos! E espero não completar os doze!

E, antes que eu pudesse impedir e fazer uma intervenção branca, carinhosa, Tita saiu do Severino, sob o olhar de todos que lá estavam. Eu fiz o gesto de ir atrás, queria ponderar, levantar bandeira branca, pedir mais um cálice de vinho… mas não foi possível. Rubinho forçou um sorriso, murmurou um pedido de desculpas e voltou a sentar-se.

— Não devia deixar ela sair desse jeito. Ela não está dirigindo, não?

— Sei lá. Nem me interessa!

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— Nossa, essa pequena divergência de opinião não era para acabar assim.

— Todo dia tem uma cena dessas! Tô cheio!

— Como é que aguentam?

— Já me acostumei. Amanhã vai estar tudo bem.

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— Jura? Amanhã esquecem? Como?

— Ah, a gente deita de costas um para o outro, e aí um pé encontra o outro, assim, como se fosse sem querer e… bem, depois dos pés vêm a mãos e… ah, acho que a partir daqui você já sabe, não é?

Um teatro, uma cena de novela.

Só voltamos a nos ver um mês depois. Os dois andavam de mãos dadas pelo Leblon, como um casal de namorados. Aproveitando que Tita falava ao celular, perguntei:

— E aí, amigo, como acabou aquela história? Foi na base do pezinho?

— Claro, como sempre.

— E o presente de casamento? Isqueiro de prata ou…

— Que nada. Mandamos um telegrama.

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