Ninguém sai de um bazar de mãos vazias. Você pode não encontrar o que está procurando, mas alguma outra coisa — qualquer uma! — não procurada, nem mesmo desejada, há de surgir à sua frente, diante dos seus olhos. Meus filhos ficavam malucos! Eu falava:
— Cada um escolhe um brinquedinho, um só. Não vale bola, que temos uma dúzia lá em casa! — Eles corriam de um lado para o outro, sem saber o que levar. Dava gosto ver!
Raul entrou na conversa:
— Uma vez minha mulher saiu para ir ao mercado em busca de um frasco de azeite grego e voltou com um par de sandálias Birkenstock, de fabricação alemã.
— Posso abrir outra garrafa?
Era a garçonete. Estávamos no Café Severino, vindo de uma missa de sétimo dia em memória do Zé Antonio.
— Afinal, de que ele morreu?
O Afonso fez aquele gesto universalmente conhecido, que indica o alcoolismo como causa da morte.
— Ih, essa é uma história longa e dolorosa — comentou alguém.
Carla largou o celular em cima da mesa.
— Como se come bem naquela cidade!
— Que cidade?
— São Paulo, pô.
— De que você está falando?
— Eu falava das cantinas paulistanas.
— Do bazar!
— Do bazar, mas depois das cantinas do Bixiga! Uma melhor que a outra!
— E o pão com linguiça?
— De comer rezando!
E outros assuntos entraram e saíram da roda, numa aparente desordem.
— Pensei que ele não bebesse mais, que tivesse parado.
Parava uma vez por ano, na noite de Natal, quando se vestia de Papai Noel.
— Caramba, não me lembrava disso!
— Uma vez quase morreu, quando caiu dentro da caixa-d’água na casa da Nairzinha.
— Será que eu estou com Alzheimer? Não me lembro de nada! Quem era a Nairzinha? Aquela loirinha que namorava toda a turma?
— Aquela era a Sandrinha.
— Uma gostosura!
— Já morreu também.
— Ah, hora da saudade não vale.
— Alzheimer não aparece assim, de uma hora para outra.
— Aparece, sim. Com meu avô foi assim. Num dia estava legal, levantou-se da mesa enquanto a família estava almoçando na casa dele… Foi ao banheiro, voltou para a mesa e pronto. Já nem lembrava qual era o nome da minha avó.
Abrimos uma segunda garrafa de vinho no momento em que uma garçonete colocava na mesa mais pão e mais queijo.
Ríamos, estávamos felizes, alegres. Era a vitória da saúde sobre a morte.
— Enterramos mais um da turma!
O inverno ensolarado se abria sobre nós. Uma pausa para a reflexão, e Raul comentou, num tom sentimental e penoso:
— Não gosto de estar bebendo e me divertindo com o nosso amigo morto e enterrado.
— Cremado — falou Afonso.
E deu uma fungada, levando o lenço ao rosto e enxugando uma lágrima.
— De que é que estávamos falando?
— De bazar. De como gostamos de quinquilharias.
— Dá para mudar de assunto?
— Claro, é pra já.
E olhando todos à volta:
— E o Neymar, hein?