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Por Lelo Forti, mixologista
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Era uma vez: os efeitos colaterais do ano de 2020

Terrorismo, oportunismo e desinformação são algumas das consequências trágicas que abalaram segmentos como o de bares

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Atualizado em 17 jul 2020, 12h29 - Publicado em 17 jul 2020, 12h26

Era uma vez um comerciante, pai de família, homem simples, trabalhador, transformado em criminoso, contrabandista da noite pro dia. Seu pequeno comércio, uma quitanda, garantia o sustento de sua família, de cinco filhos, com a venda e produção de álcool de gengibre e batata. Seu pequeno alambique garantia uma vida simples, porém justa e honesta, até que, uma simples canetada, a milhares de quilômetros dali, transformava esta típica família interiorana em comerciantes ilegais. O ano: 1920. País: Estados Unidos da América. Objetivo? Proibir toda e qualquer relação dos cidadãos americanos com o álcool. Era a famosa, cruel e contestável Lei Seca.

Essa canetada transformou a vida de milhões para sempre. Treze anos de tiro, porrada e bomba. Muitas e muitas dezenas de pequenas, médias e grandes destilarias, cervejarias e vinícolas espalhadas pelo país quebraram da noite para o dia. Bares passaram a ser clandestinos e a máfia até então pequena e desorganizada virou um império nacional bilionário, elevando delinquentes ao estrelato de gângsteres glamurosos.

Nada que os livros de história não tenham nos contado, no entanto, cem anos depois, a história tende a se repetir, com muitos capítulos semelhantes e novos absurdos corriqueiros, ocorridos durante os treze anos de duração desta Lei, que, hoje não teria o menor cabimento, porém vivemos tempos parecidos.

A pandemia teve endereço e culpados assim como a Lei Seca. Mas estes fatos deixemos para a história julgar. É surpreendente a conexão entre estes dois mundos, separados por gerações e pela geografia. A conexão é total e as atitudes também.

Assim como na Lei Seca, a desinformação levou grande parte da população a tomar as mais diferentes atitudes. Quando a pandemia chegou, e, sinceramente ninguém sabe desde quando ela circula por aqui, a falta de informação e as indefinições, brigas e oportunismo político de quem deveria “cuidar” do povo, foram a tônica de todo o processo penoso que todos nós passamos nos últimos meses. O comércio fechou, assim como fábricas, estaleiros, aeroportos, bares, academias e tantos outros setores considerados não essenciais. Empresas e empregados, à deriva, sem saber o que ou como fazer.

A onda, a moda, ou chame como quiser, foi “fique em casa”. Deixamos as autoridades municipais, estaduais e federais, assim como os agentes de saúde, infectologistas e tantos outros sanitaristas, tomarem as rédeas da doença e de todo seu protocolo. Mas esquecemos de um pequeno grande detalhe: estamos no Brasil. Terra das oportunidades mil, onde a maracutaia, a politicagem e o oportunismo vem antes do interesse nacional. Sim. Estou generalizando e tenho argumentos para tal. Ninguém se entendeu. Milhares de debates, lives e entrevistas.

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Anestesistas e tantos outros profissionais, todos entendidos e com suas verdades. Não acho ruim discordarem, é democrático, mas estamos falando de saúde, não de times de futebol, religião ou preto e branco. Falamos de vidas. No campo político tivemos os piores exemplos, assim como há cem anos. Cidades sendo fechadas sem casos comprovados. Prefeituras decretando estado de calamidade pública sem caso algum da doença.

O interesse fora “facilitar” as compras de respiradores e EPI’s, assim como medicamentos e tantas outras coisas. Sem licitação e com adendo de verbas federais. Essa não é somente minha opinião. São vários os casos que já pipocam pelo Brasil. Em 1920 foi semelhante. Cada condado, prefeito ou autoridade tomava pra si o entendimento da lei e aplicava como achasse melhor. Mesmo sendo lei federal, estados e municípios seguiam suas convicções e interesses. Lembrou algo?

Cem anos atrás, empreendedores, assim como hoje, faliram. Fecharam. Milhares de pessoas se viram sem ter o que comer. Quem resistiu sofreu com abuso de fiscais, falta de informação e politicagem. Nossos bares e restaurantes estão abertos, quase que como uma medida de resistência desde o dia 2 de julho. A clientela está na rua, parte exercendo a cidadania e circula de máscara, outra parte não. Parece que a doença não existe, ou está protegido por já ter contraído a doença. Porém sofre com o descaso público e político.

Aqui no Rio de Janeiro o que se tem visto e é relatado por muitos colegas é que nos tornamos “personas não gratas” simplesmente porque estamos tentando exercer nosso direito e dever ao trabalho.

Foi só reabrirmos os bares e restaurantes uma única noite para que pessoas mal intencionadas deturpassem o que aconteceu realmente. As pessoas não se viam há meses e era previsto que as aglomerações, por mais cuidadosos que atores do setor fossem, ocorressem. Ninguém é a favor de aglomeração. Sabemos da importância do distanciamento para o achatamento da curva da doença, ou você acredita que depois de cem dias fechados, quem conseguiu reabrir quer ter seu estabelecimento fechado novamente? Claro que não. O que se pede é uma fiscalização justa, não oportunista, deturpada.

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Somos favoráveis, sim, às fiscalizações, elas ajudam e deveriam orientar, porém que sejamos tratados com respeito e não como criminosos. Vários são os relatos de excesso da força e da intimidação ou do discurso autoritário dos fiscais que, acompanhados por muitos veículos de imprensa, intimidaram e autuaram estabelecimentos à revelia nas ultimas semanas.

Era uma vez uma fiscalização de orientação e vigilante, com fiscais preocupados com o bem-estar público dos clientes e de cumprimento das normas sanitárias. Era uma vez um poder público atuante e engajado no bem-estar social e justo. Era uma vez uma prefeitura preocupada em gerir empregos e garantir o bem-estar da população. Multas, mesmo que indigestas, são por vezes necessárias, assim como adaptações e bom senso, porém cabe ao agente público de direito a missão de evitar as aglomerações no espaço público.

A constituição garante o direito das pessoas de ir e vir e somente um agente público pode, por lei, tomar medidas para que as aglomerações sejam dispersadas, o que já acontece nas praias, parques e na orla da cidade, mas, nos bares, o que se vê é o descaso e o desvio de função.

Para quem ainda não entendeu, o comércio, assim como a saúde, precisa de apoio. Este apoio começa pelo respeito. O setor emprega milhões rapidamente, assim como desempregou milhares com a mesma velocidade. Não estamos contra a sociedade, muito menos despreocupados com a doença. Temos nossas famílias, funcionários e amigos para conviver e cuidar. Assim como muitos, também enterramos amigos, colaboradores e familiares.

Aos que estão nos chamando de gananciosos ou irresponsáveis por estarmos abertos, peço que acredite na nossa missão e compromisso com a saúde e com o emprego. Ao nobre “colunista” que nos chamou de genocidas, primeiramente exigimos respeito. Você não nos representa e, para o bem da inteligência, procure nos livros de história o significado desta palavra e aplique-a de forma justa, se é que exista uma forma de aplicação pós II Guerra. Te fará bem o estudo histórico e a reflexão.
Cheers.

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