Uber
Eu estava em Paris, o jantar acabou tarde, resolvi chamar um Uber para me levar para casa. Acostumada com a qualidade da frota carioca, choquei-me ao ver que o carro era modelo velhinho e que o motorista, um haitiano residente na capital francesa, havia trazido a namorada junto. O rapaz aproveitara a noite de sábado […]
Eu estava em Paris, o jantar acabou tarde, resolvi chamar um Uber para me levar para casa. Acostumada com a qualidade da frota carioca, choquei-me ao ver que o carro era modelo velhinho e que o motorista, um haitiano residente na capital francesa, havia trazido a namorada junto.
O rapaz aproveitara a noite de sábado para ganhar uns trocados e sair com a gata. O casal se comia com os olhos ao som de um rádio altíssimo. Ri com os pombinhos. Ela elogiou o meu perfume, eu respondi que não estava usando perfume, ao que ele se virou para a moça e, agressivo galante, ofereceu o cangote para provar que o aroma era dele.
Quando desci, dei cinco estrelas para a corrida. Tive pena de melar a noite dos dois, mas fiquei pensando no porquê de o Uber parisiense ser tão chumbrega e o carioca tão bom. A resposta que encontrei foi que o transporte urbano e os táxis franceses são tão eficientes, até quando transportam o próprio cachorro no banco do carona, que o mercado não deixa espaço para invenções alternativas, como a do Uber.
No Brasil, o aplicativo acaba de ser considerado ilegal pela Câmara Municipal de São Paulo. Lamentei a decisão. Eu entendo a revolta dos taxistas, que pagam fortunas para adquirir a licença, sei que existe uma questão tributária, mas o problema é que o mercado não oferece um serviço à altura.
Há tempos, chamar um táxi por telefone havia se transformado numa via-crúcis de incertezas. Com a Lei Seca, a bendita Lei Seca, era comum ligar para uma central nas noites de sábado e ouvir que eu deveria aguardar vinte minutos para ver se a atendente conseguiria um carro. Nove entre dez vezes, a moça retornava meia hora depois, quando retornava, dizendo que não havia nenhum veículo à disposição. Eu andava com uma lista telefônica de cooperativas na bolsa, mas a resposta era sempre a mesma.
Chegar ao aeroporto na hora marcada também havia se transformado num drama. Você tinha de ligar com antecedência e rezar para não ficar na mão. Mais de uma vez, recebi o famigerado telefonema que dizia não haver nenhum táxi disponível e acabei com as malas no meio da rua, descabelada, atrás de condução.
Depois do Uber, meus filhos passaram a ir e vir com segurança. Monitoro o trajeto do mais velho, que já está na fase de voltar para casa de madrugada; e também o do mais novo quando estou de serviço no fim de semana. Sei que eles farão uma viagem civilizada, com um motorista que trafega na velocidade permitida e num carro com cinto de segurança livre no banco de trás.
Por que, numa cidade violenta como o Rio, com transporte urbano precário, deve-se barrar uma iniciativa dessas? Além disso, muitos dos motoristas com quem circulei são profissionais demitidos pela crise da Petrobras. O Uber se tornou uma saída digna para quem perdeu seu emprego.
As licenças caras e obrigatórias me lembram o tempo do telefone fixo, em que possuir uma linha era sinônimo de investimento, não de bons serviços. Eu me pergunto se um modelo como o do Uber não é uma solução interessante até para a própria categoria.