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Blog da atriz Fernanda Torres
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A banca

  Eu nasci no Rio, mas vivi dos 3 aos 5 anos na capital paulista. Quando voltei, Ipanema estava no auge, com os hippies morando na praia, as butiques que imitavam as de Londres, a lanchonete Chaplin, na esquina da Farme, servindo hambúrguer americano e a Rozenlândia bem embaixo do nosso prédio. A Rua Paulistânia, […]

Por fernanda
Atualizado em 25 fev 2017, 18h08 - Publicado em 18 abr 2015, 01h00

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Eu nasci no Rio, mas vivi dos 3 aos 5 anos na capital paulista. Quando voltei, Ipanema estava no auge, com os hippies morando na praia, as butiques que imitavam as de Londres, a lanchonete Chaplin, na esquina da Farme, servindo hambúrguer americano e a Rozenlândia bem embaixo do nosso prédio. A Rua Paulistânia, em São Paulo, ficava num bairro residencial de casas geminadas. Era uma cidade do interior, se comparada à efervescência da Ipanema dos anos 70. Mas o que me fez cair de amores pela vida nova foi o jornaleiro da Visconde de Pirajá, uma banca grande, tocada por um torcedor doente pelo Fluminense.

Ela está lá até hoje, no ano passado cruzei com o dono.
Eu e meu irmão gastávamos horas comprando os álbuns de figurinhas, os gibis da Mônica e as coleções em fascículos para encadernar. Uma banca de jornal é um mundo para uma criança, museu de curiosidades, mistura de diversão, conhecimento e arte.

Quando nos mudamos para o Jardim Botânico, a esquina da Frei Leandro com a rua principal tinha açougue, boteco, lavanderia, quitanda, padaria, ponto de ônibus e, é claro, uma banca de jornal. Meu irmão era viciado em história em quadrinhos e aguardava com ansiedade o novo Homem-Aranha, o último Batman, o Thor, o Homem de Ferro e o Hulk. Eu gostava de culinária, artesanato e colecionava receitas e pontos de crochê, além de revistas de corte e costura, daquelas que vêm com os moldes dentro.

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Cresci, tive filhos e acabei na Lagoa, perto do Parque da Catacumba. Eu amo a Lagoa, apesar da falta de comércio. A ciclovia e o parque compensam, mas a padaria, a quitanda e a lavanderia, de vez em quando, fazem falta. Quando me mudei, existia uma banca de jornal pequena, no sinal de pedestre que dá acesso ao espelho-d’água. Eu tinha muito apreço por aquela banquinha, que oferecia o toque das esquinas a um pedaço da cidade que carece delas. Depois de pedalar com as crianças, eu gastava meu tempo besta ali, lendo as manchetes dos jornais do dia e a capa das revistas penduradas do lado de fora. Meus filhos compravam a mesma revista Recreio dos meus tempos de moleca, e eu voltava feliz, como se a banca fosse o elo perdido entre a minha infância e a deles.

Um dia, fui andar e a banca não estava mais lá. Sumiu, desapareceu, nunca entendi o porquê. Agora, jornaleiro, só na Fonte da Saudade. Meu filho pequeno diz que o dono não queria sair, mas algum problema com a licença o obrigou a fechar as portas. Ele reclama sempre da falta da banca, e eu entendo, sinto o mesmo, é como se tivessem acabado com a humanidade da vizinhança. Só sobraram a calçada pelada, a reta, os carros e o sinal.

Escrevo para pedir a volta da banca de jornal em frente ao 3330 da Avenida Epitácio Pessoa. As crianças de 5, 10, 15, 20, 40, 60 e 80 merecem.

Um bairro sem jornaleiro não é bairro, é passagem.

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