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Um panorama da música clássica
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Flores da história

Quem passeia pelas ruas do Rio e admira as arvores cobertas de flores rosadas, não imagina o quanto as Bougainvilleas e a ópera têm em comum. Tanto a flor deve seu nome ao navegador Louis Antoine de Bougainville, quanto a ópera no Rio de Janeiro a memória de sua primeira casa.   “Nós pudemos, numa […]

Por fernanda
Atualizado em 25 fev 2017, 17h39 - Publicado em 2 fev 2016, 11h48

Quem passeia pelas ruas do Rio e admira as arvores cobertas de flores rosadas, não imagina o quanto as Bougainvilleas e a ópera têm em comum. Tanto a flor deve seu nome ao navegador Louis Antoine de Bougainville, quanto a ópera no Rio de Janeiro a memória de sua primeira casa.

 

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“Nós pudemos, numa sala assaz bela, ver as obras-primas de Metastasio,

representadas por uma troupe de mulatos, e ouvir estes trechos divinos

dos grandes mestres da Itália, executados por uma má orquestra

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que regia então um padre corcunda em trajes eclesiásticos”

Louis Antoine de Bougainville,

“Voyage autour du Monde, par Ia Frégate du Roy “La Boudeuse” et Ia Flute “L’Etoile”, en 1766-1769”

 

Aproveitando os ganchos das semanas passadas, se as mulheres tiveram um papel fundamental na construção do imaginário da ópera na cabeça dos poetas e intelectuais do século XIX, aos descendentes de africanos não coube papel menor na sua história. No seu nascimento, no primeiro ‘teatro’ do Rio, lá estavam, dando corpo e voz àquela sala de espetáculos descrita pelo navegador francês: era Casa da ópera do Padre Ventura.

Também conhecida como Ópera dos Vivos e dos Mortos, era fruto do trabalho e da imaginação de um certo Padre Boaventura Dias Lopes, Ventura de alcunha, nascido num distante 1710. Chega ao Rio com 19 anos, numa fragata que trazia a nova do casamento do futuro D. José I com a Infanta de Portugal, D. Mariana Vitória de Bourbon. A fama de ser o próprio Padre Ventura “mulato” é questionada e talvez tenha sido fruto do fato dele tocar o que se chamava então de “viola de mulato.” Seja qual for sua etnia, sua companhia de ópera era formada por mulatos, assim como nos anos seguintes , grande parte da vida musical “erudita” da côrte. Talvez tenha sido por causa dos festejos de núpcias reais que seguiram a sua chegada que o jovem Ventura tomou gosto pelo mundo dos espetáculos. Muitos anos depois, já sacerdote, ergueu sua Casa da ópera. Ficava nas cercanias do chamado Largo do Capim, a mesma área que depois seria conhecida como o ‘Rossio’ e onde, hoje, existe a atual Praça Tiradentes; perto dela está a Rua do Teatro que mesmo sem ter um teatro por lá, testemunha silenciosa sua memória. O edifício durou algumas décadas e embora não fosse luxuoso ou especialmente confortável era descrito como suficiente para as necessidade da população; isto é, para os padrões de um Rio de Janeiro anterior a chegada da família Real em 1808. Incendiou-se em uma noite do final do século XVIII enquanto se encenava a farsa musical “Encantos de Medéa” de Antonio José da Silva, o Judeu — mórbida coincidência, se pensarmos que este foi queimado vivo pela igreja católica em uma tarifa (nem tão) ‘santa’ inquisição.

Bougainville passou pelo Rio de Janeiro de 21 de Junho a 15 de Julho de 1767, e graças a sua narrativa temos a história de óperas italianas cantadas por mulatos. Em meio ao público não era impossível encontrar o Vice-Rei, Conde da Cunha, misturado não somente ao ricos da época como a toda sorte de público popular. Em “Antiqualhas e Memórias do Rio de Janeiro”, relato daqueles tempos (mas muito posterior), publicado pelo IHGB, narra-se a “grande surpresa” que teve o navegador francês ao ver “um padre da corôa, de batina, corcunda e de côr parda o director do theatro e regente da orchestra, subindo de vez em quando ao palco, para, tocando violão, cantar modinhas e dansar o fado!” Eu, em pleno 2016, fico maravilhado é com a coragem, a pura aventura que deve ter sido ensinar e encenar ópera italiana no Rio de Janeiro daqueles tempos. Só a idéia de partituras manuscritas, vindas de navio e cruzando o Atlântico me deixa com a respiração suspensa e um arrepio na espinha. Já a história do Padre Ventura e sua Casa da Ópera, embora breve, é ainda hoje uma aventura arrepiante — de muito fôlego.

foto andre

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