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Por Carla Knoplech, jornalista e especialista em conteúdo digital
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Troquei meu “Vai passar” por um “É o que temos”

Uma crônica de um dia em quarentena em tempos de Coronavírus

Por Carla Knoplech
Atualizado em 23 abr 2020, 13h50 - Publicado em 23 abr 2020, 13h36

Vai ter Live hoje? Vou botar na agenda. Hum, mas é na mesma hora da Teresa Cristina. Vou lá rapidão só pra vê-la cantar “Andança” que hoje é especial Beth Carvalho. Nossa, ela tá contando que a Beth foi enterrada com o título de eleitor na mão, vou ter que ficar até o final pra ouvir toda a história. Ai, não vou aguentar ficar até o final, já são meia noite e meia. Se bem que amanhã é feriado, né? Será que eu bebo uma taça de vinho hoje? Não, sua louca, ainda é segunda-feira. Quanto será que as pessoas estão bebendo na quarentena? Será que se for uma média de quatro vezes na semana é tranquilo ou configura alcoolismo? Preciso voltar a malhar pra compensar isso. Vou tentar acordar cedo pra fazer o treino a tempo da blogueira que eu gosto. Ontem ouvi o Braincast especial da Comunicação Muito Violenta e os convidados disseram que não entendiam o fenômeno das pessoas acompanharem Lives se elas podiam ouvir a música em alta qualidade depois no Spotify. Porra, é difícil entender isso? É porque a gente gosta de saber que as pessoas do outro lado estão ali naquele momento, uai! Dá prazer ver jogo de futebol gravado? Eu, hein. Que dificuldade. Esses bla-bla-blás de podcasts estão muito chatos em época de Coronavírus. Ou será que eu que estou mal humorada além da conta?

Vou ler essa coluna aqui no Medium que defende a baixa produtividade na quarentena. Mas, que saco, eu não gosto de ter baixa produtividade, meu plano para 2020 era dominar o mundo. Vai ter que ficar pro segundo semestre. Ou será que pro ano que vem? Deixa eu ver se o Átila mandou alguma atualização nova na lista do Telegram sobre isso, peraí. Não mandou. O que será que o Átila está fazendo agora? Será que está fazendo um pão? Pelo menos eu ainda não fiz um pão. Já tem até hashtag pra isso, estão chamando de #pãodemia. Se bem que dizem que fazer pão acalma, né? Vou tentar fazer um pão. Vou na rua hoje. Primeira vez essa semana. Máscara ok, álcool gel ok, cabelo preso ok. Vou brotar na padaria pro desespero do Corona. Cheguei na padaria. Lotada. Aff, será que só eu estou fazendo quarentena? Me vê seis pães franceses, por favor? Será que essa luva de plástico da atendente é suficiente? Moça, cuidado com o Coronga. Culpa por poder fazer quarentena e ela não. Fila no caixa. Será que tem dois metros daqui pra tia da frente? Não acredito, um moleque espirrou do meu lado! DO-MEU-LADO. E agora? Será que se eu ficar uns 30 segundos sem respirar as gotículas já caíram? Estou ficando louca. Cheguei em casa. Vou tirar a roupa toda. Que saco essa roupa toda pra lavar. Esqueci de comprar a farinha pro pão e comprei todo o resto. Cinco da tarde.

Saudades de uma coletiva de atualização do Ministério da Saúde, né minha filha? Quanto tempo mais será que isso dura, gente? Vou ler um pouco de projeções de economistas pra ver se me acalmo. Como seria bom ter uma liderança decente, né? Imagina alguém que pegasse na nossa mão, comprasse testes suficientes pra ter uma noção real do problema e acalmasse a população em vez de tossir em cima dos outros e defender a ditadura? Ia ser ótimo. Figurinhas novas no chat de WhatsApp. Eu ri. Áudio de três minutos da minha amiga explicando uma receita. Sentei pra trabalhar um pouco e levantei três horas depois. Dor nas costas. Vou aproveitar e fazer uma massagem no cabelo agora no banho. Pensei aqui que se eu não aprender a fazer feijão nessa quarentena não faço nunca mais, amanhã vou buscar um passo a passo no Panelinha. Vou sentar pra ver um pouco de Stories. Que isso, já são oito horas? Daqui a pouco já tem Live da Teresa de novo.

Vou fazer um Facetime com a família. Que saudade de abraçar. Liguei a TV. Histórias tristes no jornal. Culpa por poder fazer quarentena. Vou ver a nova temporada de Fauda na Netflix. Meta pros próximos cinco anos: ir morar na Serra em uma casa ampla com natureza. É possível fazer planos tão distantes assim? Acho que não. Não aguento mais essa frase: “vai passar”. Vai passar quando, gente? Daqui a um mês? Dois meses? Um ano? E essa pilha de mortos enterrados? E a população ignorando tudo isso? Baixei o e-book novo do Krenak. Comecei a ler. Arrebatador. Um novo mundo. É isso. Nem melhor e nem pior. Só novo. Sigamos com ele. A ideia de felicidade não é viver no presente? É aqui e agora então. Vinho na geladeira pra dar um grau e simbora pra Live no sofá. É o que temos.

Carla Knoplech é jornalista, fundadora da agência Forrest, de conteúdo e influência digital, consultora e professora

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