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Blog sobre as ruas do Rio de Janeiro
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Tempos de Glória

Ofuscado por prostitutas e mendigos, o bairro da Glória mostra as suas preciosidades, como a Rua do Russel por Pedro Paulo Bastos A Praça Luiz de Camões, na Glória, é um dos maiores símbolos da antiga nobreza carioca. O entorno da estação Glória do metrô intimida o pedestre que não conhece bem a região. Modestos […]

Por Pedro Paulo Bastos
Atualizado em 25 fev 2017, 19h37 - Publicado em 5 ago 2011, 03h28

Ofuscado por prostitutas e mendigos, o bairro da Glória mostra as suas preciosidades, como a Rua do Russel


por Pedro Paulo Bastos

A Praça Luiz de Camões, na Glória, é um dos maiores símbolos da antiga nobreza carioca.

O entorno da estação Glória do metrô intimida o pedestre que não conhece bem a região. Modestos camelôs compartilham o espaço originalmente aristocrático da Rua da Glória com pequenas lojas comerciais e mais um bando de pivetes que se espalham pelo Largo que leva o nome do bairro. No último domingo, 31, já estava certo de que teria de me desvencilhar deles para percorrer a Rua do Russel da forma mais tranquila possível. Eu ziguezagueava pelas calçadas cobertas de paredões neste primeiro trecho da rua, que conecta o largo à Avenida Beira-Mar. Homens e mulheres, nitidamente embriagados e distantes dos seus mundos, gargalhavam ao pular o gradil de acesso ao Outeiro. Eis o panorama que assola o bairro, há tempos em um processo cada vez mais contínuo de decadência.

Uma manobra à direita e estava livre daquele corredor polonês. É ali onde a Rua do Russel luze imponente, com seus altos prédios históricos e uma praça, a Luiz de Camões, loteada de palmeiras, áreas livres e muitas esculturas. Esse trecho da Glória sempre despertou-me o interesse por um passeio a pé, embora sempre insistisse em apreciá-lo através das janelas dos ônibus. Definitivamente, como pedestre, a perspectiva é outra. E muito mais encantadora.

Antes mesmo de ler sobre alguns destes prédios da Glória, consegui captar naquele momento a sua essência a la francesa. A Praça Paris, que precede a Luiz de Camões, faz jus ao seu nome, pelo desenho perfeito de suas alamedas, peculiar à capital da França. Já na Rua do Russel é a arquitetura quem entra em cena, mostrando o que o Rio tem de melhor – ou o que pelo menos teve. Esqueça os edifícios bonitinhos residenciais da Praça do Lido, em Copacabana, além de outras referências do tipo mais modestas pela cidade. Na Glória, a arquitetura é genuinamente monumental. Tirou-me o fôlego, comprovando a ideia de que o pedestre que esteve por apenas uma vez ali conhece (ou pelo menos consegue conhecer) muito mais desse espaço urbano do que um motorista que diariamente trafega por ele.

O Edifício Ipú, no número 300 da Rua do Russel: projeto de Ricardo Buffa.

Todos os edifícios, sem exceção, têm algo a contar. Não passam despercebidos. O que mais chama a atenção é o Edifício Lage, construído especialmente para o dono, Henrique Lage, em 1925. O detalhamento da fachada é impressionante. Inspiração italiana, estilo eclético. No número 496, o belíssimo Edifício Ipú é um símbolo do art déco, com varandas sinuosas e janelas em forma de escotilha. A lástima, aqui, fica a cargo do estado de conservação do prédio, bastante a desejar. A proximidade com o Hotel Gloria Palace (antigo Hotel Glória), repleto de tapumes devido à sua reforma, evidencia ainda mais o aspecto “cortiço” em que se encontra o Edifício Ipú.

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A falta de espaço de lazer ou de garagem nesses prédios antigos da Glória é compensada pela presença da Praça Luiz de Camões, indispensável à Rua do Russel. De grande porte, ela é uma mescla de parque com cultura. Bustos de bronze de personagens importantes da história brasileira, estrangeira e religiosa estão por lá. Entre eles, o de Getúlio Vargas, bem grande, ao lado do então desconhecido para mim Robert Stephenson Smyth Baden-Powell, criador do escotismo. O melhor de lá é o espetáculo de águas que circunda a estátua de São Sebastião, preso sobre o que parece ser um pedaço de tronco e o corpo flechado. A praça é grã-fina, símbolo dos bairros chiques do Rio antigo.

Balaustrada na Rua do Russel

A partir da esquina com a Ladeira da Nossa Senhora da Glória, a Rua do Russel fica mais sinuosa e em desnível com a Avenida Beira-Mar, que a margeia. Essa separação entre as duas vias é demarcada por uma balaustrada centenária, toda baseada em pedra. As luminárias são originais e preservam sua verdadeira idade, ornamentadas por diversos monumentos. Entre eles, o que comemora os cem anos da abertura comercial dos portos brasileiros.

Edifício Milton

O trecho sinuoso da Rua do Russel acaba no encontro com outra praça conhecida como Esplanada Adolfo Bloch. Mais edifícios idosos compõem o jogo urbano desta parte do bairro, como os charmosos Itacolomy e Itatiaia, o meio afrancesado Milton (n. 710) e o monumental Columbia, já na esquina com a Praia do Flamengo. O Columbia também tem no seu térreo o Empório Santa Fé, loja de vinhos e restaurante, mais sofisticado. Como havia dito anteriormente, a Rua do Russel é tão original que lá se pode encontrar um belo exemplo de art nouveau, estilo raro pela cidade: o Antigo Villino Silveira, uma casa cheia de detalhes excêntricos, levantada em 1915.

Em qualquer outro lugar do mundo, a Glória seria ponto turístico irrecusável. A Rua do Russel reúne tudo o que os tempos dourados cariocas tiveram de melhor. Caminhar por lá é respirar, ainda que numa certa fantasia, os ares de um charmoso Estado da Guanabara, ares expelidos pelo mobiliário urbano intocável do lugar. Em meio a isso, ainda há um teleférico que te leva, de graça, ao Outeiro da Glória, lá em cima. Senti-me transportado a um outro Rio, quase pré-histórico, ao confrontar-me com aquela igreja. A vista nem se fala. Pior que tem carioca que nem sabe que a Glória é assim. Estão perdendo um baita e belo passeio…

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Fontes:
Guia da arquitetura Art Déco no Rio de Janeiro / Centro de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro; organizador: Jorge Czajkowski. 3. ed. – Rio de Janeiro: Casa da Palavra: Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, 2000.
Guia da arquitetura eclética no Rio de Janeiro/ [organizador Jorge Czajkowski]. – Rio de Janeiro: Centro de Arquitetura e Urbanismo, 2000.


Para ver mais fotos da Rua do Russel e da Praça Luiz de Camões, visite o grupo do As Ruas do Rio no Facebook. Aproveite para dar o seu “curtir” e ficar por dentro das atualizações do blog. E, principalmente, a divulgá-lo!

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