“Não titubeei, mas perdi o sono”, diz Debora Bloch sobre Odete Roitman
Atriz analisa a repercussão da novela, relembra impacto da icônica vilã de "Vale Tudo" e revela como reagiu ao convite para viver personagem

A nova versão de Odete Roitman não só caiu nas graças do público como se tornou um dos assuntos mais comentados da internet. A vilã continua provocando, gerando memes e reflexões. A personagem, interpretada por Débora Bloch no remake de Vale Tudo, ganhou contornos contemporâneos, mantendo a crueldade clássica, mas adicionando camadas de complexidade e provocação. Em entrevista ao videocast Conversa Vai, Conversa Vem, do jornal O Globo, a atriz refletiu sobre o impacto da personagem, que vai do humor ácido ao debate racial e à representação da mulher de 60 anos na TV.
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Na última semana, uma fala de Odete gerou forte repercussão nas redes: “Ela nem é tão preta assim”, disse a vilã, referindo-se à personagem Maria de Fátima. A frase, que toca em temas como racismo cordial e colorismo, marcou uma virada definitiva no perfil da antagonista. “É a fala mais preconceituosa da Odete até agora — mas não é a primeira. O bom é que está gerando discussão, trazendo à tona questões importantes. Quanto mais falarmos sobre isso, melhor”, afirmou Débora.
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A atriz destacou que, em outras épocas, frases como essa seriam naturalizadas — e que a cena reflete avanços na consciência social. “As pessoas achavam que isso era elogio. A repercussão mostra que algo mudou”, comentou. Ela também celebrou o impacto social da novela, ao citar o caso de Lucimar, personagem que cobra a pensão do filho: “Em uma hora, 270 mil mulheres pediram informações sobre esse direito. Olha que coisa incrível.”
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Sobre o fascínio que a personagem exerce — a ponto de transformar haters em fãs — Débora observa: “As pessoas saíram do armário, é assustador. Tem gente dizendo ‘estou concordando com a Odete, será que sou uma pessoa horrorosa?’. Isso diz muito sobre o Brasil de 2025.” Segundo ela, a personagem reflete uma elite que despreza o país, que acredita na meritocracia e ignora as raízes da desigualdade: “Odete representa esse pensamento colonial, escravagista, classista. Ela é racista, e isso está vivo, infelizmente.”
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Ainda assim, Bloch reconhece o humor como uma ferramenta poderosa: “A Odete atual é uma mulher com humor. Isso enriquece, dá complexidade. Vilões sempre tiveram esse apelo. Jung já dizia que eles mexem com os arquétipos do inconsciente coletivo.”
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A atriz também comentou o sucesso da personagem nas redes sociais e a forma como o consumo de novela mudou: “Não se assiste mais sentada no sofá, ao vivo. É quando se quer, no Globoplay, no TikTok, no Instagram. A audiência agora é medida de outras formas. Se tudo que Odete fala viraliza, é sucesso.”

A sensualidade de Odete, que aparece em cena de camisola, namora homens mais jovens e desafia convenções, também foi assunto da conversa. “A mulher de 60 quer ser livre. Não quer parecer uma de 30, quer parecer viva”, disse, citando a jornalista Mariliz Pereira Jorge. “A liberdade é o novo colágeno.”
Questionada se concorda ao ouvir que Odete é uma “grande gostosa”, Débora riu e respondeu: “Vou ficar lisonjeada. Mas é isso, a gente está trabalhando para isso. Não é só sobre corpo, é sobre repertório. É gostoso estar com alguém com bom papo, humor, inteligência.”
Ela destacou que a adaptação escrita por Manuela Dias moderniza a figura feminina. “Sempre vimos homens mais velhos com mulheres muito mais jovens. Agora, ver uma mulher de 61 anos se divertindo, sem compromisso afetivo, é algo novo. Isso é da nossa época.”
Ao comentar o convite para viver a nova Odete, Débora contou que não hesitou. “Não titubeei. Era uma grande responsabilidade, sim, mas ator vive esperando por um personagem bom, um texto bom. Ficar assistindo à Beatriz Segall não estava me ajudando. Em um momento, eu decidi que precisava encontrar a minha Odete”.
Sobre o suposto clima tenso nos bastidores, foi categórica: “Desde que cheguei, o ambiente é ótimo. A gente se diverte junto. E isso nem sempre acontece.”
A estética da personagem também entrou na conversa: o topete virou meme, e a atriz confessou rir de si mesma ao se olhar no espelho. “A gente queria uma imagem austera, de mulher muito rica. E isso está no cabelo.”
Com formação teatral e passagem por grandes palcos, Debora Bloch vê diferenças em relação à nova geração de atores, mais ligada às redes sociais. “Não cresci nesse universo. Estou tentando me adaptar, mas é outro tipo de formação. Produzir conteúdo não é o mesmo que decorar um texto de sete páginas. A experiência e a maturidade são uma bênção.”
Para além das telas, a atriz revelou que continua “rueira”, e que a curiosidade é o que a mantém viva. “Projetos, desejos, estar em contato com o novo. A profissão me permite isso — cada semana é um elenco novo, uma troca nova.”
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A personagem que mais a transformou? A professora da série Segunda Chamada, da Globo. “Foi um mergulho na realidade dos professores de EJA, nos alunos adultos da periferia. É uma realidade dura, que a gente conhece na teoria, mas não vive.”