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Máquinas do tempo, câmeras antigas dão ângulo retrô ao presente do carioca

Uma turma que busca trégua do mundo hiperconectado troca as fotos de celular pelo hobby de ir atrás de boas imagens com aparelhos analógicos

Por Marcela Capobianco
Atualizado em 16 dez 2022, 09h43 - Publicado em 16 dez 2022, 07h00
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Câmeras fotográficas: analógicas ou digitais, elas vêm conquistando adeptos no pós-pandemia -  (iStock/Getty Images)
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Ícone da pop art americana, Andy Warhol (1928-1987) disse, certa vez, que “a ideia de esperar por algo o torna mais excitante”. Numa era pré-redes sociais, o já alardeado conceito de sociedade do espetáculo não havia sequer tido uma provinha do imediatismo dos stories do Instagram e dos vídeos-relâmpago do TikTok. Curioso notar que, justamente em meio a esse frenético universo, uma turma vem navegando em direção oposta e deixando, por uns instantes que seja, o celular de lado. Não estranhe se esbarrar em uma dessas moderninhas pistas de dança da noite carioca com alguém com uma câmera analógica ou com uma Sony Cybershot a tiracolo — modelo digital de estrondoso sucesso do início dos anos 2000. Consideradas obsoletas por muita gente, essas maquininhas do tempo estão de volta na maré de itens guindados do baú sob o impulso de um sentimento de nostalgia que teve origem na pandemia. “O celular virou uma extensão da mão, e a gente passou a registrar tudo o tempo todo. Com minha câmera digital, eu paro, respiro e escolho um momento especial para clicar”, diz a criadora de conteúdo Amanda Britto, 36 anos, que resgatou o aparelho retrô das profundezas do armário e faz questão de carregá-­lo na bolsa para onde vai.

Bandeira analógica: Bárbara Rosalinski gosta das surpresas que o filme traz ao ser revelado -
Bandeira analógica: Bárbara Rosalinski gosta das surpresas que o filme traz ao ser revelado – (./Arquivo pessoal)

A onda nostálgica fez sobretudo os millennials, a geração nascida entre os anos 80 e 90, buscarem conforto na memória da adolescência. As calças de cintura baixa e a hashtag Y2K (“year 2000” ou “ano 2000”, em português), que pipoca ao milhões pelas redes, são um indício disso. A ala ainda mais jovem, que não conheceu um mundo sem internet nem sem conexão, também é afeita às fotos tremidas e com flash estourado. Tais defeitos da captação digital foram há muito superados pelas câmeras profissionais de última geração e até pelos smartphones. Pois a bossa agora é exatamente a imprevisibilidade no processo de fotografar. A produtora cultural e fotógrafa Bárbara Rosalinski, 33 anos, é uma das que agitam a bandeira analógica, fincando o pé para convencer os clientes a optar pela linguagem, digamos, artesanal. “Muitas pessoas têm medo de confiar no filme, como se um cartão de memória não pudesse dar problema e deixar o profissional na mão”, observa. “É um exercício de paciência aceitar o tempo das coisas. Não tenho total controle sobre o que vai ser revelado e é uma delícia descobrir as surpresas que o filme traz”, relata.

Celular de lado: Amanda Britto usa uma câmera digital dos anos 2000 para fotografar -
Celular de lado: Amanda Britto usa uma câmera digital dos anos 2000 para fotografar – (./Arquivo pessoal)

Vez ou outra, a atriz Bruna Marquezine, 27 anos e em fase hollywoodiana, publica em suas redes algum registro feito com uma câmera antiguinha. Ela é uma entre várias celebridades. “Todo mundo está à procura de uma identidade própria e, como é difícil inovar o tempo todo, a nostalgia surge como um caminho possível para impactar novos públicos e, claro, vender”, explica a professora de pesquisa de mercado da ESPM Rio Karine Karam. “É interessante ver como os elementos que marcam uma conexão com o passado vão ganhando força através dos influenciadores digitais em um mundo hiperconectado”, arremata. Quem quiser investir no hobby que prepare o bolso: os preços das câmeras digitais que remetem aos saudosos anos 2000 partem de 1 000 reais na internet. Já as pessoas que pretendem explorar o terreno da fotografia analógica devem, antes de tudo, saber que um bom filme de 36 poses não sai por menos de 100 reais. Além disso, a busca por bons estúdios de revelação, quase escassos, exige empenho.

A atriz Bruna Marquezine: uma das várias celebridades que aderiram -
A atriz Bruna Marquezine: uma das várias celebridades que aderiram – (./Reprodução)

O alemão Rudolf Arnheim (1904-2007), por décadas professor de psicologia da arte em Harvard, dizia que a fotografia consiste no fato de que “algo real deixa rastros em uma mídia de arquivamento”. Não importa se o equipamento é analógico ou digital. Diante das altas definições de imagens oferecidas pelos ultramodernos celulares, repletos de filtros, regressar ao passado promove um respiro. Para o fotógrafo Lucas Bori, 44 anos, figurinha assídua nos blocos de Carnaval, a quantidade de megapixels numa imagem não importa, desde que ela traduza a intensidade do momento.

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“Há doze anos comprei uma Canon G11 que já era ultrapassada. Eu precisava de um modelo básico, leve, que me permitisse entrar no meio dos foliões sem parecer invasivo”, conta Bori. “Com essa câmera, que sobrevive a chuva, cerveja e purpurina, acabei desenvolvendo uma série sobre a folia com um olhar muito particular. É minha fiel escudeira.” Ele lembra que, quando começou a clicar as noitadas cariocas, era um dos únicos a portar uma máquina digital estilo “point & shoot” (modelo compacto que não permite troca de lente). Hoje, muita gente empunha câmeras parecidas. “Um vazamento de luz numa foto custava um emprego antigamente. Agora, é um charme. O que era intolerável se transformou em expressão artística”, avalia Bori. “Encostar o olho na câmera permite uma outra dimensão a quem está fotografando. A gente passa a enxergar o mundo através da lente, algo que um celular, mesmo se valendo da tecnologia mais apurada, nunca vai proporcionar”, enfatiza Bárbara Rosalinski. E, desconectada das redes, essa turma se conecta ao mundo ao vivo e em cores.

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