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‘Nossos botequins estão ficando cada vez mais paulistas’, diz antropólogo

Autor de guias e livros sobre o assunto, Paulo Thiago de Mello analisa o cenário boêmio do Rio e afirma: 'O aburguesamento dos bairros inclui os botequins'

Por Cleo Guimarães
21 jul 2020, 14h39

O fim da atividades do Hipódromo, fundado há 75 anos no Baixo Gávea, não surpreendeu o antropólogo Paulo Thiago de Mello. Uma das maiores autoridades do país quando o assunto é boteco – ele é autor das seis primeiras edições do guia Rio Botequim e do livro “Memória afetiva do botequim carioca”, este em parceria com José Octavio Sebadelhe -, Paulo lamenta o fim do bar, mas diz compreender o que se passou ali, e em outras casas tradicionais da cidade.

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“O gosto dos cariocas está mudando. Agora as pessoas vão ao bar para ter experiências gastronômicas. E isso os botecos de verdade não oferecem. Nem é a função deles“, diz. Paulo concedeu a seguinte entrevista a VEJA RIO:

Paulo, à direita, com Paiva e Ed: no Jobi (Nelson Vasconcelos/Reprodução)

Causou comoção na cidade o fechamento do Hipódromo, um bar que, segundo seus próprios frequentadores, não servia boa comida. Qual seria o motivo de tanto carinho? Os botequins não têm como ponto principal a gastronomia. É isso que diferencia um boteco de verdade desses bares de rede. Botequim é um clube social, é onde as pessoas vão para encontrar os amigos, para passar o tempo. Isso está acabando. Agora quem vai ao bar quer chope artesanal e linguicinha com vários molhos.

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Nas redes sociais, ex-frequentadores do bar exaltam os garçons do Hipódromo. Sim, eles faziam toda a diferença – e não só lá. O Garçom não está ali só para atender. Ele te entende, te ajuda. Quantas vezes eu vi o Paiva, do Jobi, negociando pendura de conta com o Narciso (dono do bar)? Ele cansou de chamar táxi para meninas que beberam demais… tem toda uma relação. No Hipódromo tinha o Lacerda, superdiscreto. Ele não puxava papo, mas se você puxasse, era ótimo. O diferencial do Hipódromo eram os garçons e o clima. Tinha um clima bom. O chope sempre foi fraco, a comida também não era boa. As pessoas não iam lá por isso.

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Como a gentrificação (o processo no qual um bairro ou rua recebe investimentos que acabam elevando o custo de vida sem que haja uma proteção aos antigos comerciantes e moradores) pode influenciar nesta “renovação” dos bares? A gentrificação, esse aburguesamento dos bairros, inclui os botequins, claro. Moro em Botafogo, agora com aluguéis altíssimos e até apelido de “BotaSoho”, e perdi o bar que chamava de meu. Era o Flor de Botafogo, escondidinho, delicioso. Não aguentou a crise, assim como vários outros aqui perto.

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A cabeça dos frequentadores de botequim também mudou, não? Exato. Agora todo mundo entende de comida, de cerveja, gosta de harmonizar os pratos com drinques. A função do boteco – que era a de ser um ponto de encontro, um lugar para ficar passando o tempo -, mudou. Virou um programa gastronômico, os clientes vão para tomar cerveja artesanal e comer pratos bem feitinhos. A gente está ficando meio paulista nesse sentido: bar lá sempre foi ‘barzinho’ e sempre teve comidas especiais.

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Então botequim bom é o que serve comida ruim mas tem clima agradável e bons garçons? Para mim, o que faz o botequim ser bom não é a comida boa. Não é uma condição, pelo contrário. Mas se ela for gostosa, ótimo.

Na sua opinião, quais os melhores botequins da cidade? Adoro o Bar Rebouças (Rua Maria Angélica, 197. Jardim Botânico); o Bode Cheiroso, no Maracanã (Rua General Canabarro, 218), um boteco típico, com mesinhas de mármore; a Casa Villarino (Av. Calógeras, 6-B, Centro), uma viagem no tempo, linda demais; a Adega Pérola (Rua Siqueira Campos, 138, Copacabana), com ótimo chope, variedade enorme de petiscos e o Beto, garçom ótimo; o Galeto Sat’s (Rua barata Robeiro, 7, Copacabana) e a Adega da Velha (Rua Paulo Barreto, 25, Botafogo) , ambos do mesmo dono. O cara investiu na gastronomia mas conseguiu manter o clima de botequim. São muito bons.

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