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Ingrid Guimarães:“Vamos quebrando estereótipos”

Recordista nacional de bilheteria, atriz de 51 anos fala de etarismo e machismo na profissão: "os grandes comediantes do mundo foram homens"

Por Melina Dalboni
Atualizado em 19 dez 2023, 12h18 - Publicado em 15 dez 2023, 06h00

Recordista nacional de bilheteria, com 21 milhões de espectadores que já foram ao cinema vê-la na telona, Ingrid Guimarães, 51 anos, administra a ansiedade, dela e do próprio mercado, a cada nova produção. Em dezembro, com um intervalo de apenas vinte dias, será vista em dois novos filmes — O Primeiro Natal do Mundo, no Prime Video, com Lázaro Ramos e Fabiana Karla, e Minha Irmã e Eu, ao lado de Tatá Werneck, em cartaz a partir do dia 28. Desta vez, ela atua não só como protagonista, mas também como produtora e roteirista do longa-metragem rodado em Goiás, onde nasceu e foi criada. “Sempre quis fazer alguma coisa sobre o universo de onde eu vim, onde as relações são muito próximas. No interior, primo é meio irmão e vizinho é meio primo”, conta a atriz, que este ano foi homenageada no Festival de Gramado, para o qual nunca havia sido nem convidada. “O PIB do cinema brasileiro se deve à comédia, então não dá para desprezar o gênero.” Em conversa com VEJA RIO, ela tratou de temas espinhosos, como o machismo no humor, e falou da determinação em quebrar estereótipos.

Embora a comédia leve milhões de pessoas ao cinema, ainda fica em segundo plano nas premiações. Pesa o preconceito contra o gênero? Tem, sim, mas melhorou porque a gente insistiu. Quando você pensa que o Charles Chaplin ganhou um Oscar só no final da vida, entende que o preconceito nessa área é histórico. Mas o PIB do cinema brasileiro se deve à comédia, então não dá para desprezar o gênero.

Sendo recordista de bilheteria, a cada estreia se renova a cobrança por mais público? Nossa Senhora, pelo amor de Deus, muito. Nem sei se eu queria esse título, porque é muita responsabilidade. O cinema mudou no mundo e no Brasil, e ainda não voltou ao patamar pré-pandemia. Acho que há uma questão financeira aí. O programa todo envolve estacionar o carro, comprar pipoca, e o ingresso é caro. O streaming tirou muita gente do cinema. As pessoas se acostumaram a ver filme em casa.

Em Minha Irmã e Eu, você e Tatá Werneck vivem duas irmãs bem diferentes. Como é a relação longe das telas? Construí uma relação de irmã mais velha com a Tatá. Ela tem dez anos a menos que eu e, como toda gênia, é caótica. Esquece cartão de crédito, não lembra a senha, tem um TDAH forte. Quando vejo, estou ajudando com pediatra, cartão, casamento. Ela até conta que um dia brigou com o Rafa (Vitti), ia terminar com ele e me ligou. Eu disse: “Não faz isso, pelo amor de Deus, ele é muito fofo”. Na mesma hora, ela virou para ele e falou: “Volta, Rafa, calma, vamos conversar”.

O machismo ainda está muito presente nesse meio da comédia? Historicamente, a comédia é um dos gêneros mais machistas. Olhando lá atrás, vemos que os grandes comediantes do mundo foram homens, porque quem escrevia e dirigia eram eles. Charles Chaplin, os Irmãos Marx, Buster Keaton, Monty Python — duvido que não houvesse uma mulher maravilhosa nessa época. Fico chateada de não existir até hoje um programa como o Porta dos Fundos de mulheres, um movimento feminino de comediantes. Mas vamos quebrando os estereótipos.

Pode dar um exemplo? Minha geração começou no papel da empregada das novelas do Manoel Carlos: eu, Fabiana Karla, Thalita Carauta. Nosso texto se resumia a: “A senhora aceita um café?”. E Mônica Martelli fazia a secretária. A frase dela era: “Doutor Arnaldo na linha C”. Hoje, as comediantes protagonizam filmes e já levam milhões de pessoas ao cinema e ao teatro.

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“Historicamente, a comédia é um dos gêneros mais machistas. Minha geração começou no papel da empregada das novelas do Manoel Carlos”

Chegou a se insurgir contra isso? Uma vez, fui chamada para fazer um programa do Renato Aragão em que o Didi sonhava com uma gostosa e uma mulher mais feia. E eles me escalaram para fazer a feia. Eu recusei e avisei que não aceitaria mais nenhum papel desse tipo. Foi quando estreamos com a peça Cócegas e ficamos dez anos em cartaz.

Foi difícil decolar na carreira? Ouvi que eu não tinha tipo para ser atriz, que eu não tinha star quality. E um diretor famoso da Globo me disse, quando eu tinha 30 anos: “Na sua idade, já passou da fase da protagonista. O melhor para você é o Zorra Total”. Protagonizei De Pernas para o Ar 1 aos 37 anos, amamentando minha filha de 3 meses. Meu pai sempre falava: “Não desista. Guerra é guerra”.

Por que decidiu sair da Globo e seguir para o streaming? O núcleo de humor da Globo ficou abandonado. Falei com o Ricardo Waddington que eu queria fazer Cóce­gas na televisão, queria reunir eu e Heloísa Périssé de novo, ter um programa sobre mulheres de 50. E ele disse que não havia espaço. A Amazon veio com essa proposta, de liberdade artística e de fazer cinema. Financeiramente também era muito bom.

Acha que envelhecer ainda é tabu no país? Muito. Outro dia, uma pessoa que trabalha comigo me disse: “Pare de falar desse assunto de 50 anos. Você vai ficar com imagem de mulher mais velha”. É duro mesmo. O Brasil não está preparado para ver a gente envelhecer.

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As redes podem ajudar a romper essa visão? Postei outro dia uma foto minha com amigas de biquíni, todas cinquentonas. Deu mais de 20 000 curtidas. A foto era algo que poderia ser normal, a gente de biquíni, mas é como se fosse diferente, fora do esperado, só porque temos uma determinada idade.

Chegar à menopausa foi difícil? Muito, não me falaram que havia um antes e depois. Várias mulheres não se reconhecem mais. Comecei a tratar do assunto nas redes, tentando mostrar com leveza coisas que são difíceis para nós, e passei a ser abordada por gente agradecendo. Virou uma missão.

O sexo mudou aos 50? Uma vez, fiz uma sessão de sexo tântrico, e a terapeuta me mostrou que a mulher foi aprendendo a fazer sexo para o outro até no jeito de gozar, gemendo alto. Com o passar da idade, a busca é por mais qualidade, para satisfazer mais você mesma. Os filmes e a internet ajudaram a quebrar tabus, assim como a popularização dos vibradores. Vibrador é o presente que eu mais dou e o que mais ganho. É uma maneira de se autoconhecer.

Como se cuida? Se tenho um tempo disponível, vou para a terapia. Se tenho dois tempos, vou para a terapia e a ginástica. Não gosto de malhar, mas já entendi que me faz bem e que eu quero pegar um sapato no chão aos 70. Já dermatologista é o seguinte: eu brigo com meu marido, mas não brigo com ela.

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