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O renascimento de um ícone

Palacete que já foi hotel de luxo e dormitório estudantil é recuperado para abrigar a mostra Casa Cor

Por Leticia Pimenta
Atualizado em 5 jun 2017, 14h24 - Publicado em 5 set 2012, 19h04
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Repleto de disputas políticas e levantes militares, 1922 foi um ano turbulento para o Brasil. Mas a crise não impediu que o país celebrasse o Centenário da Independência com a devida pompa. Capital federal, o Rio de Janeiro passou por uma grande transformação urbana para receber a Exposição Internacional. Como acontece agora, com a aproximação da Copa do Mundo e da Olimpíada, a expectativa sobre o aumento de visitantes estrangeiros por causa do evento movimentou o setor hoteleiro na época. Para dar vazão ao afluxo de turistas, foram construídos três grandes empreendimentos de luxo: os hotéis Copacabana Palace (que não ficou pronto a tempo e foi aberto apenas no ano seguinte), Glória e Sete de Setembro. Do trio, o Copa e o Glória mantiveram sua função por décadas e atualmente passam por reformas. O terceiro imóvel, no entanto, teve um destino diferente. Localizado na antiga Avenida do Contorno (atual Rui Barbosa), no Flamengo, o complexo arquitetônico já nasceu cercado de polêmica, por ter sido bancado pela prefeitura. Uma forte campanha na Câmara Municipal contra a manutenção de um hotel custeado com dinheiro público levou a seu fechamento quatro anos após a inauguração. Incorporado ao patrimônio da União e repassado à Universidade do Brasil (atual UFRJ) no fim da década de 30, o prédio teve utilizações distintas no decorrer do tempo até ficar abandonado a partir de meados dos anos 90. Pois esse endereço histórico singular ganha nova movimentação com a 22ª edição da Casa Cor, mostra de decoração que vai ocupá-lo a partir de 3 de outubro. “A visibilidade do evento nos ajudará a obter verba para a recuperação do prédio”, acredita Paulo Vidal, diretor do Instituto Estadual do Patrimônio Cultural, órgão responsável pelo tombamento do edifício, em 1987.

Assim como os hotéis da Riviera Francesa que lhe serviram de inspiração, o Sete de Setembro era um oásis praticamente cravado na areia, erguido mais de vinte anos antes de o projeto do Aterro do Flamengo levar o mar algumas centenas de metros adiante. O imponente conjunto de estilo eclético era formado por quatro prédios com 257 quartos, sete a mais que o rival instalado na Glória. Em 1926, já destituídos de sua função original, dois dos prédios foram cedidos ao internato da Escola de Enfermagem Anna Nery. Aluna da instituição na virada da década de 50, a enfermeira Terezinha de Jesus guarda boas recordações daquele tempo. Três bailes anuais reuniam estudantes de outras faculdades e ajudavam a descontrair o ambiente, famoso pela disciplina mantida com mão de ferro. “Só assim era possível controlar gente do Brasil inteiro que vinha morar sozinha no Rio”, brinca Terezinha, que conheceu o marido, aluno de medicina, em uma das festas.

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Com o fechamento do internato para as futuras enfermeiras, no início de 1973, o imóvel do Flamengo se transformou em dormitório estudantil e ganhou o nome de Casa do Estudante Universitário (CEU). Com isso, passou a abrigar reuniões de partidos clandestinos e os primeiros encontros do Comitê Brasileiro pela Anistia. Por mais de vinte anos recebeu jovens de todo o país que chegavam para estudar no Rio de Janeiro. No início dos anos 90, entretanto, a CEU já tinha perdido fazia tempo seu propósito inicial. Abrigava famílias de moradores de rua e chegou a ter um assassinato cometido em seus corredores. Foi definitivamente fechada em 1995. “Quando entrei no prédio pela primeira vez, fiquei tão horrorizado que desisti de morar lá”, conta o arquiteto mineiro Thoni Litsz, que se mudou para o Rio em 1994, disposto a fazer faculdade, e hoje se dedica a montar um ambiente no local como participante da Casa Cor.

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Embora o imóvel tenha passado por obras nos últimos anos, a escassez de recursos inviabilizou sua plena revitalização. O edifício principal ganhou reformas na estrutura, nas fachadas e nas varandas, e, desde 2009, uma ala restaurada do complexo serve de sede ao Colégio Brasileiro de Altos Estudos, ligado à UFRJ. Ainda assim, o conjunto carece de muitos reparos. “Temos 4?000 metros quadrados de área para recuperar. Tudo nele é em grande escala. Existem, por exemplo, 200 portas com 24 dobradiças cada uma”, afirma o arquiteto Paulo Belinha, diretor da Divisão de Projetos de Imóveis Tombados da UFRJ. Por ora, a ocupação temporária da Casa Cor traz como contrapartida a recuperação da parte hidráulica e sanitária, além de uma grande faxina que inclui pintura nas paredes e reforma de banheiros e piso. Nas primeiras visitas, as organizadoras da mostra se assustaram com a quantidade de morcegos que viram lá dentro – eram mais de 300. Resta a torcida para que a reabertura do palacete em outubro o reintegre à vida da cidade e seja um ponto final na sina de abandono que caracteriza sua história.

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