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Talento à flor da pele

Com fila de espera de até seis meses por um horário, tatuadores ganham status de artistas ? e faturam alto

Por Ernesto Neves
Atualizado em 5 dez 2016, 14h08 - Publicado em 2 out 2013, 17h25

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Concentrada tal qual uma pintora em busca do traço perfeito, a tatuadora Thais Valente precisa de silêncio absoluto para iniciar mais uma sessão de trabalho. Em seu ateliê, num condomínio da Barra, ela evita qualquer tipo de interferência, tanto que só um grupo bem restrito de amigos e parentes sabe o número de seu celular. “Meu telefone tocava sem parar, criei uma fobia desses aparelhos”, conta. “Hoje, a interação é toda via e-mail. Só falo com o cliente quando ele vem ao estúdio.” Como acentua essa atitude reservada, Thais faz parte de uma elite de tatuadores cariocas responsável por elevar o desenho corporal a objeto de desejo. Em comum, eles têm clientes famosos ? alguns até estrelas internacionais ? e uma agenda completamente abarrotada, além de várias tatuagens pelo corpo, como mostram estas fotos. Quem quiser marcar uma consulta com Thais, por exemplo, só vai conseguir horário em março do próximo ano. Tamanha demanda resulta de um talento apurado e amplamente divulgado no Instagram, onde ela reúne 14?000 seguidores. Também contribuiu para sua notoriedade o fato de ter delineado o mapa do Brasil no tornozelo da atriz Isis Valverde, uma inestimável garota-propaganda.

Em função da natureza do ofício e de sua valorização exponencial, os integrantes desse seleto grupo passaram a ser contemplados como artistas, que é como eles realmente se veem. “Os melhores trabalhos são os que me permitem criar, mas muitas vezes ficamos reféns do desejo do cliente”, destaca Daniel Tucci, que busca inspiração nas imagens de teor fantástico do artista plástico holandês M.C. Escher (1898-1972). Em um terreno dominado por figuras esotéricas, rabiscos tribais e ideogramas enigmáticos feitos a partir de um modelo, Tucci aposta na exclusividade. “Não tenho um livro com desenhos prontos. Quem vem aqui sabe que terá um trabalho único”, diz ele, que já estampou a pele de Lady Gaga, Cleo Pires, Christiane Torloni e Ricky Martin. Detentor de clientela aqui e lá fora, ele se divide entre seus dois estúdios, em Copacabana e na Noruega. Quem também tem mercado no exterior é a carioca Luiza Fortes, que já atuou na Alemanha e na Inglaterra. Seu traço delicado faz sucesso com as mulheres, que correspondem a 90% dos frequentadores de seu estúdio, em Botafogo. “Já trabalhei em vários lugares do mundo, mas no Rio as pessoas são mais carinhosas. Elogiam e até mandam presentes”, afirma. A remuneração fica à altura da fama que adquiriram: chegam a cobrar 6?000 reais por um desenho grande no braço.

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Arte milenar praticada por egípcios e nativos da Polinésia, a tatuagem nem sempre foi vista com bons olhos. Nos anos 50, os desenhos corporais foram introduzidos no Brasil pelo dinamarquês Knud Harald Lykke Gregersen, conhecido como Lucky Tattoo. Montado na cidade portuária de Santos (SP), seu ateliê era frequentado basicamente por marinheiros. No Rio, um dos pioneiros foi o Caio Tattoo, que abriu as portas na Galeria River, no Arpoador, em 1977, e marcou época com sua freguesia de surfistas e adeptos da contracultura em geral. Nas décadas de 80 e 90, o procedimento acabou se popularizando, impulsionado de um lado pela força emergente da cultura pop e do outro pelos famosos que aderiram à prática. Hoje, tatuadores consagrados viraram estrelas, com direito a programa de TV e assédio nas ruas. É o caso do israelense Ami James, que se tornou conhecido internacionalmente ao protagonizar o reality show Miami Ink. Convidado para participar de uma ação de marketing no Rock in Rio, ele foi festejado pelos fãs na Cidade do Rock. Antes de retornar aos Estados Unidos, fez elogios aos colegas cariocas. “No Rio há profissionais de alto nível, que me deixaram impressionado”, declarou.

Como ocorre na moda, a indústria da tatuagem está sujeita a aspectos sazonais. A cada temporada, novos estilos entram em cena, enquanto outros são jogados para escanteio. “Há uma clara tendência por artes maiores, com imagens gráficas e menos figurativas”, afirma Tucci, que é autodidata, como os demais colegas. No momento, estão em alta as corujas, símbolos da sabedoria. Luiza Fortes, por sua vez, desdenha de uma tendência recente. “Não faço fotografias de parentes. A chance de a pessoa ficar insatisfeita com o resultado é grande”, explica. Com a autoestima do Rio lá em cima, também entraram em voga ícones como o Corcovado e o calçadão de Copacabana. “Já fiz até um letreiro da boate Help”, revela Tucci, citando a extinta casa noturna da Avenida Atlântica. Numa cidade vaidosa, onde os corpos estão sempre expostos, as praias são uma galeria para essas pinturas à flor da pele.

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