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Profissionais e serviços para gestantes impulsionam mercado de nicho

Da mesma forma que acontece com os casamentos e outras celebrações que envolvem momentos marcantes da vida, o nascimento dos bebês transformou-se em um pulsante mercado

Por Daniela Pessoa e Carla Knoplech
Atualizado em 2 jun 2017, 12h29 - Publicado em 22 ago 2015, 01h00

Cada detalhe do nascimento de Lucas foi cuidadosamente planejado. Assim que sentiu as primeiras dores, no fim da tarde do último dia 3 de julho, a mãe, a blogueira Antonia Leite Barbosa, ligou para a equipe médica responsável pelo parto. Em seguida, fez outras chamadas: para o banco de células-tronco que manterá guardadas amostras retiradas do cordão umbilical da criança por no mínimo cinco anos (um serviço contratado por 10 000 reais), para a equipe de filmagem que registraria a chegada do neném e para a dupla de profissionais responsável pela decoração da suíte em que ela ficaria internada e receberia as visitas. Antes de sair de casa, escolheu a roupa que usaria e se maquiou. Como o trânsito estava engarrafado, ela, o pai, Joaquim, e a equipe de filmagem chegaram quase simultaneamente à maternidade, em Laranjeiras. No centro cirúrgico, Antonia pediu ao marido para pôr em uma caixa de som portátil a trilha sonora planejada para a ocasião. Ao som de Song for Lucas, canção especialmente composta por uma tia que mora nos Estados Unidos, o bebê veio ao mundo, com seus 3,230 quilos. O clima de celebração prosseguiu no quarto do 6º andar, e brigadeiros, bombons, biscoitinhos personalizados com a letra “L” e uma decoração com enfeites em tons de azul recebiam as visitas. “Você não vai ser mais mãe só porque contratou todos esses serviços, mas na verdade é tudo muito legal”, avalia Antonia, que, em meio aos preparativos, incluiu ainda uma consultora para adquirir na Califórnia todo o enxoval de seu rebento.

Antonia Leite Barbosa
Antonia Leite Barbosa ()

Da mesma forma que acontece com os casamentos, as festas de debutante, as formaturas e outras celebrações que envolvem momentos marcantes da vida, o nascimento dos bebês transformou-se em um pulsante mercado, em que fervilham os mais inusitados tipos de serviço e profissionais. O objetivo é tornar a chegada do filhão ou da filhotinha um acontecimento único, bem como propiciar à futura mamãe uma gestação tranquila e auxiliá-la nas múltiplas tarefas que terá pela frente. Trata-se de um negócio blindado contra crises, que cresce a passos largos. Um exemplo é a indústria de confecção. Enquanto o setor como um todo teve retração de 0,6% no ano passado, as vendas de artigos de bebê e criança cresceram 6%. A mais importante feira de produtos do ramo, a Mega Gestante e Bebê, com edições anuais no Rio, em São Paulo e Curitiba, passou de quarenta expositores, agrupados em 600 metros quadrados na primeira versão carioca, em 2008, para 230, distribuídos por 4 000 metros, no Riocentro, no ano passado. É aqui, segundo a organização, que se concentram as mamães mais consumistas do país, que ficam em média cinco horas circulando entre os estandes. “Todas são ansiosas e compram na empolgação, porque querem proporcionar o melhor ao filho. Mas as cariocas são as que mais gastam. Se existe uma roupinha de 300 reais e outra de 100, elas vão na primeira opção”, revela Bruno Batista, diretor executivo da atração.

Infografico produtos bebês
Infografico produtos bebês ()

A chegada de um filho significa uma dramática mudança para uma mulher. Mais do que festa, celebração e alegria, o processo implica uma radical transformação no estilo de vida. Se no passado consultas regulares ao obstetra e a leitura de livros de puericultura como o clássico A Vida do Bebê, escrito pelo médico Rinaldo de Lamare, supriam as necessidades básicas da futura mamãe, hoje a realidade é bem distinta. A começar pelas próprias alterações no corpo da gestante. Especialistas em exercícios físicos para grávidas, nutricionistas e endocrinologistas zelam para que a balança oscile o mínimo possível, em torno de 10 quilos. Pilates, treinamento funcional, hidroginástica, alongamento e até mesmo musculação fazem parte da rotina das mulheres que querem manter a saúde e a boa forma em treinos específicos. A apresentadora de TV Fernanda Gentil seguiu as recomendações de sua personal trainer Roberta Gabriel à risca. Ela completou os nove meses de gravidez de Gabriel, na última semana, com o acréscimo de 12 quilos à silhueta. “Se não tivesse o acompanhamento especializado e fizesse tudo pela minha cabeça, teria engordado uns 30 quilos”, brinca Fernanda. Da mesma forma, profissionais como massagistas e esteticistas ajudam a reduzir o inchaço típico dessa fase. “Faço regularmente uma drenagem linfática que alivia dores na coluna e ajuda a relaxar, porque toda grávida é muito ansiosa. Quando a sessão acaba, eu me sinto outra pessoa”, diz a atriz Regiane Alves, que está no oitavo mês de gestação de Antônio, seu segundo filho.

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Uma simples visita a maternidades de primeira linha mostra como essas instituições mudaram seu perfil de serviços e correram para se adequar às novas necessidades de suas clientes, mais preocupadas com o conforto e a infraestrutura. Com salas de transmissão ao vivo do nascimento, espaços relaxantes para as mães e equipe especializada em decoração de apartamentos e serviços de bufê, esses locais lembram qualquer coisa, menos uma casa de saúde. A unidade da Perinatal na Barra oferece um serviço de concierge, que organiza festinhas com direito a champanhe na antessala das suítes, salas de parto com cromoterapia e uma banheira no estilo hidromassagem na qual a grávida pode relaxar durante o pré-parto. O grupo investiu cerca de 200 000 reais nos mimos. Já na Maternidade São Francisco, em Niterói, itens como bola suíça e massageador elétrico para controle de dor, música ambiente e banheira para parto natural na água estão entre os mais pedidos pela clientela. Outra atração é uma sala com capacidade para vinte pes-soas que podem ser acomodadas em confortáveis poltronas, batizada de Cineparto. Ali, parentes acompanham as imagens transmitidas diretamente do centro cirúrgico, com direito a close do recém-chegado no telão de alta definição de 55 polegadas. O serviço sai por 450 reais, incluindo a transmissão ao vivo pela internet. Acrescida de bufê com espumante nacional, a première de trinta minutos de duração fica em 1 125 reais. “Essas transmissões tornam a experiência mais acolhedora e alegre para a família e os amigos e tranquilizadora para a gestante, que compartilha sua emoção com entes queridos”, diz Eneas Paiva, gerente comercial da maternidade niteroiense.

A especialização e a profissionalização de serviços ligados à gravidez e ao parto que se veem hoje no Rio seguem uma tendência internacional. Nos Estados Unidos, existe até mesmo uma denominação específica para os profissionais do ramo. Trata-se dos baby planners, cuja formação é homologada por duas instituições — o International Maternity and Parenting Institute (Impi) e a International Academy of Baby Planner Professionals (IABPP), ambos dedicados também a oferecer cursos sobre o assunto. “É uma imersão em todos os aspectos que envolvem a chegada do bebê”, explica Gisele Espirito Santo Soares, carioca que cursou a especialização no ano passado. “O trabalho, como o nome diz, envolve todo o planejamento para a chegada do bebê e o primeiro ano de vida da criança. Vai desde as compras do enxoval, a decoração e os preparativos para a ida à maternidade até uma orientação sobre cursos, amamentação, sono e segurança no ambiente doméstico”, diz. Da mesma forma que oferece programas de formação profissional, o mercado americano conta com redes de lojas dedicadas exclusivamente ao segmento (veja no quadro ao lado os produtos mais desejados). Cadeias como Motherhood, Maternity e Destination Maternity têm unidades espalhadas pelas principais mecas de consumo frequentadas pelos brasileiros (Miami, Orlando e Nova York). Consultorias especializadas oferecem roteiros de compras personalizados que custam cerca de 350 dólares. Em média, um enxoval completo, com roupas, carrinho, cadeirinhas e acessórios, custa cerca de 3 000 dólares e significa um acréscimo na bagagem de 60 a 80 quilos. 

Como todo mercado em ebulição, o de serviços e produtos para gestantes também oferece itens controversos. Pediatras criticam uma novidade que tem ganhado adeptos entre as mães com afinidade com a cultura oriental e um estilo de vida alternativo. Trata-se de um colar de âmbar produzido com resina de árvores da Nova Zelândia e do leste da África que ganhou farta publicidade quando a modelo Gisele Bündchen surgiu em uma foto com os filhos usando a peça. “É um objeto muito tradicional na China, onde se acredita que ele protege contra o mau-olhado e, quando usado por mãe e filho, fortalece o vínculo entre ambos”, explica Ângela Mattos, especialista em massagens e terapias orientais voltadas para gestantes e bebês. Bonito, a princípio, mas os médicos advertem que o produto, vendido por cerca de 140 reais, pode trazer risco às crianças. “É apenas uma bijuteria, e bebês não devem usar isso, pois podem se sufocar com o cordão”, avisa o médico Daniel Becker. A maternidade hoje se tornou mais fácil, confortável e prazerosa, mas nunca é demais lembrar que a saúde da mãe e do bebê está acima dos modismos. ■

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