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Tesouros de uma dinastia

Pela primeira vez vai a leilão um conjunto de objetos e obras de arte pertencente à família Monteiro de Carvalho, sobrenome sempre associado a tradição, requinte e glamour

Por Letícia Pimenta
Atualizado em 5 jun 2017, 14h37 - Publicado em 7 mar 2012, 17h48

O ato de se desfazer dos objetos pessoais de um ente querido representa, muitas vezes, um segundo luto. Ao mesmo tempo, dar um destino aos seus pertences ajuda a amenizar a dor e a desatar os laços com o passado para seguir em frente. É exatamente esse o momento por que passa o clã Monteiro de Carvalho, um dos mais tradicionais da cidade. Dois anos após o falecimento repentino de Astrid, vítima de um ataque cardíaco aos 66 de idade, os parentes decidiram leiloar o espólio da filha mais velha do patriarca Joaquim Monteiro de Carvalho, o Baby. Marcado para a próxima terça (6) e estendendo-se pelos dois dias seguintes, no Atlântica Business Center, em Copacabana, este será o primeiro pregão da história que reunirá em peso peças da família.

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Dos 1?300 itens catalogados inicialmente, serão oferecidos cerca de 400, com lances mínimos que, somados, atingem 3 milhões de reais. A exemplo da maioria dos acervos de foco mais pessoal, o de Astridinha, como ela era conhecida, prima pela diversidade. São louças, tapetes, prataria, móveis, imagens sacras, objetos de decoração e obras de arte suficientes para decorar vários apartamentos. Boa parte foi um legado do pai, a quem ela era muito ligada. Ao contrário de coleções que obedecem ao recorte de determinado movimento estético ou época, a de Baby, e por extensão de sua filha, foi pautada tão somente pelo gosto pessoal dos dois. ?Não foi algo reunido com objetivo meramente artístico, mas uma coleção da vida inteira, que tem desde bibelôs até quadros de pintores brasileiros importantes?, afirma Sérgio Francisco, o mais velho dos quatro filhos da colecionadora, que foi casada com o médico e empresário Pedro Alberto Guimarães.

Em meio à variedade de objetos que serão submetidos ao bater do martelo, o destaque, sem dúvida, é o conjunto de porcelanas da Companhia das Índias datado dos séculos XVIII e XIX, reunindo peças que pertenceram a dom João VI (veja o quadro na pág. 15). Quando chegou ao Brasil, em 1808, a família real portuguesa trouxe nos navios muitas dessas louças, algumas com até 3?000 itens. Após a queda do regime imperial e o exílio dos Bragança na Europa, no fim daquele século, seus bens foram leiloados e se dispersaram por antiquários, museus e coleções particulares. Admirador da monarquia e leitor voraz de tudo o que seja relacionado ao tema, Baby nutria o desejo de ter um pedaço da história para si, sentimento que é a força motriz de muitos colecionadores. Seu porcelanato forjou-se nos leilões a que compareceu a vida inteira no Brasil e no exterior. A parte doada à filha reúne mais de 140 peças, entre pratos, sopeiras e travessas. Chama atenção pela delicadeza o denominado ?serviço dos pavões?, cujo tema central são um casal de aves e arranjos florais. Uma sopeira de 23?000 reais tem o lance inicial mais alto nessa leva. ?Dispor desse grande número à venda de uma vez é ocasião rara. Em geral, oportunidades surgem no mercado isoladamente?, diz a marchande Soraia Cals, responsável pela seleção.

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Conhecida pelo desvelo com que tratava o acervo, Astrid virou uma guardiã dos objetos da família, a exemplo das roupas de bebê, da jarra e da travessa de prata do século XIX usadas nos batizados. São peças avaliadas em 5?000 reais, que figuram entre as preferidas de Lilibeth Monteiro de Carvalho, irmã da socialite e inventariante de seus bens. ?Ela era muito caprichosa, sempre atenta aos detalhes. Era do tipo que pensava no lacinho do embrulho de um presente?, conta Lilibeth, primeira mulher do ex-presidente Fernando Collor. Embora acanhada dentro do pacote todo, a fatia de obras de arte abrange os itens mais caros do leilão. Dos vinte quadros relacionados, merecem um lugar especial Mulata, de Di Cavalcanti (1897-1976), com lance inicial de 350?000 reais, e Terraço Avarandado, de Cícero Dias (1907-2003), cujo preço começa em 125?000 reais. Valores mínimos bem menores foram fixados para a coleção de santos, que era um dos xodós de Astrid. Muito religiosa, ela mantinha em casa um oratório repleto de imagens. Entre os pequenos adornos decorativos, vale ressaltar as maçanetas de cristal Baccarat do século XIX, que o patriarca geralmente comprava em feiras de antiguidades, como a da Praça XV, da qual era frequentador. ?Embora não tenha valor financeiro altíssimo, um conjunto como esse é um achado?, acredita Pedro Alberto, filho de Astrid.

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Dona do Grupo Monteiro Aranha, que tem participações estimadas em 1 bilhão de reais em empresas de diversos setores, da fabricação de celulose à incorporação imobiliária, a aristocracia Monteiro de Carvalho tem uma trajetória que remonta aos anos 20. Foi nessa década que o engenheiro e arquiteto Alberto Monteiro de Carvalho e Silva se instalou no Rio com a mulher e os filhos, Alberto e Joaquim, o Baby. Além do mundo dos negócios, o sobrenome ganhou realce em outra frente distinta. Ficaram famosas as festas realizadas no palacete de Santa Teresa, onde os Monteiro de Carvalho receberam figuras das altas-rodas nacional e estrangeira. Assim, cercados de sofisticação e glamour, tornaram-se símbolo do bem viver, como denota outro naco do espólio que também irá à hasta pública, em paralelo à coleção. O patrimônio em questão é a Villa Beatriz, em Santa Teresa, primeira residência dos Monteiro de Carvalho no Rio. Lá Astrid viveu com o ex-marido, criou os filhos e promoveu grandes recepções. Avaliada em 14 milhões de reais, a mansão erguida em um terreno de 12?000 metros quadrados abrigou durante décadas a coleção que em breve sairá das mãos da família, encerrando outro capítulo da história de uma dinastia.

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