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Roberto Medina se prepara para estrear o Rock in Rio em Las Vegas

Dono de uma biografia com episódios como a quase falência em 1985 e um sequestro, o empresário se prepara para levar o seu festival para os Estados Unidos

Por Sofia Cerqueira, de Las Vegas
Atualizado em 2 jun 2017, 12h39 - Publicado em 11 abr 2015, 01h00

Erguida no meio do deserto, no Estado americano de Nevada, Las Vegas vive em eterno frenesi, com néons em profusão, hotéis monumentais, shows a cada esquina, quilômetros de shoppings e, claro, muita jogatina nos mais de 100 cassinos que tomam a região central. É nessa atmosfera, entre o tilintar das maquininhas caça-níqueis e o giro acelerado das roletas, que o empresário Roberto Medina decidiu dar a sua cartada mais ambiciosa: a estreia do Rock in Rio na meca do entretenimento mundial. Com um investimento de 75 milhões de dólares, a estrutura do festival já ganha forma em um terreno de 400 000 metros quadrados na Las Vegas Boulevard, conhecida como Strip, a rua mais famosa da cidade. Ali, em uma área três vezes maior que a da sede oficial do festival, no Parque dos Atletas, na Barra da Tijuca, 700 operários trabalham pesado para montar estruturas como as ruas cenográficas e torres com tirolesas. A um mês do início dos shows, cada segundo conta. Enquanto martelos, furadeiras e máquinas soam no terreno, Medina e sua equipe ainda correm atrás de patrocinadores para cobrir as cotas de patrocínio que faltam (duas de um total de quatro) e preparam estratégias para divulgar o evento e desencalhar ingressos (para cada dia, dos 85 000 previstos, apenas 30 000 foram comprados). O empresário, entretanto, não se abate. “Eu vim para a cova dos leões, montar um festival maior e muito melhor do que os que existem aqui”, diz ele. “Eu sabia que não seria fácil.”

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Conexão Rock in Rio Brasil e Las Vegas
Conexão Rock in Rio Brasil e Las Vegas ()

 A cidade de Las Vegas, onde tudo é superlativo e hiperbólico, é de certa forma um lugar no qual Medina se sente em casa. O empresário carioca sempre pensou grande. Em 1980, convenceu Frank Sinatra (1915-1998) — seu cantor preferido — a pisar pela primeira vez na América do Sul e a cantar no Maracanã. O show entrou para o Guinness Book, com um público de 170 000 pessoas. No primeiro Rock in Rio, em 1985, incluiu o Brasil definitivamente na rota do showbiz internacional, com atrações como Queen, AC/DC e James Taylor. Tamanhos feitos, porém, não tornaram as coisas mais fáceis para a conquista da América, em que ele tem como principais concorrentes os festivais Lollapalooza (de Chigaco) e Coachella (surgido na Califórnia). Por lá, arregimentou pesos-­pesados como a rede de TV NBC, o conglomerado MGM Entertainment e o Cirque du Soleil, que conta com uma poderosa base na capital do jogo e da diversão. Isso não significa, entretanto, que os obstáculos foram menores. Medina tentou contratar os Rolling Stones para o evento, mas o grupo estava com a agenda fechada para a turnê americana. A divulgação do evento é muito mais complexa que no Brasil, pois não há uma emissora de audiência efetivamente nacional e o público se dispersa por milhares de canais regionais. Com isso, as campanhas publicitárias tiveram de ser concentradas em Las Vegas e na vizinha Califórnia. “Esse é um movimento estratégico. Não vim para ganhar dinheiro desta vez”, reconhece Medina, que já realiza edições de seu projeto em Portugal e na Espanha. “O Roberto é um visionário. Acreditamos que o festival vire um de nossos maiores acontecimentos anuais”, diz Pat Christenson, presidente da Las Vegas Events, empresa de promoção turística da cidade.

Rock in Rio, no Parque dos Atletas, em 2013
Rock in Rio, no Parque dos Atletas, em 2013 ()

Aos 66 anos, Medina tem uma história que daria um filme. Apesar de ter trazido Sinatra ao país com apenas 31 anos, foi somente depois de criar o Rock in Rio, em 1985, que ele se tornou uma figura de projeção nacional. Quem o via em meio às estrelas do pop e do rock não tinha ideia do drama que viveu nos bastidores do festival, que juntou mais de 1,3 milhão de pessoas em um descampado de Jacarepaguá. Após sucessivos empecilhos que enfrentou na construção da primeira Cidade do Rock, viu-se obrigado a desmontar toda a estrutura que pretendia usar em edições seguintes. “O Brizola mandou destruir tudo. Acho que ele temia que eu me tornasse político”, diz, referindo-se ao e­­x-governador fluminense. Atolado em dívidas e sem poder repetir o evento a curto prazo, ele perdeu todo o seu patrimônio — inclusive a sede de sua empresa, um prédio de onze andares na Lagoa. Só restou o imóvel onde morava, na Barra. “Durante o festival, já sabia que tudo aquilo ia acabar. Morri por dentro, mas não deixava transparecer”, relembra. A conta do prejuízo chegou ao equivalente a 8 milhões de dólares em valores de hoje. Medina passou um ano em depressão profunda. Recuperado, transformou em obsessão a tarefa de reequilibrar as finanças. “Mandei emuldurar em um quadro a foto do último cheque que usei para pagar a dívida. Está no meu quarto até hoje.”Quando já planejava a montagem do segundo Rock in Rio, em 1990, viveu um episódio ainda mais traumático. Foi sequestrado e ficou em um cativeiro por dezesseis dias, amarrado com arame farpado e constantemente atormentado por torturas psicológicas. “Os sequestradores faziam roleta-russa comigo. Eu via quando um deles colocava a bala na arma e depois vinha atirar em mim. Ali eu só pensava que a morte era questão de tempo.” Para libertá-lo, a família pagou um resgate de 2 milhões de dólares. “O Roberto merece cada centavo de seu sucesso. Vi esse homem sofrer muito e nunca desistir de sonhar”, diz o publicitário Nizan Guanaes, que iniciou a carreira na agência do colega, a Artplan.

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Roberto Medina na montagem do primeiro Rock in Rio, em 1985
Roberto Medina na montagem do primeiro Rock in Rio, em 1985 ()

Com notável apetite por desafios nos negócios, Medina não se dobra diante das dificuldades. Foi com essa disposição que decidiu marcar em um intervalo de apenas quatro meses dois eventos emblemáticos: sua entrada nos Estados Unidos, em maio, e a festa comemorativa dos trinta anos do Rock in Rio, em setembro. Ao planejar as duas empreitadas para este ano não previa o derretimento do real ante o dólar, o que lhe rendeu grandes dores de cabeça. No evento americano, a variação cambial afetou os planos de engordar as plateias com turistas brasileiros. Dos 5 000 pacotes postos à venda até agora, só 3 000 saíram. Nas apresentações no Rio, a oscilação da moeda alavancou o custo dos shows. Valendo-se desse argumento, a organização do evento aumentou o preço dos ingressos, de 260 para 350 reais. A medida, no entanto, obrigou a empresa a abrir mão de 12 milhões de reais que esperava captar com incentivos fiscais. Mesmo com o reajuste, na última qui­nta-feira, em menos de duas horas se esgotaram os ingressos para os dias de shows de Rihanna, Queen e Katy Perry.

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Filho do empresário Abraham Medina (1916-1995), dono da rede de lojas de eletrodomésticos Rei da Voz e um dos maiores varejistas do país no anos 50, o criador do Rock in Rio cresceu em uma mansão no Bairro Peixoto. Com a decadência dos negócios da família nos anos 60, o garoto que sonhava ser poeta começou a trabalhar. Aos 17 anos, vendia antenas coletivas. Chegou a iniciar o curso de direito, mas o abandonou assim que conseguiu um emprego numa agência de publicidade. Criativo, logo se destacou. Entre outras coisas, teve a ideia de distribuir folhetos imobiliários nos sinais de trânsito, uma novidade na década de 70. Fã da Disney, onde já esteve 29 vezes, chegou a fazer um estudo de viabilidade para trazer uma filial da terra do Mickey para a Barra. O empresário, que só anda com os cabelos milimetricamente alinhados para trás, não fuma e raramente bebe uma taça de vinho. Como os astros com quem convive, tem suas manias: coleciona bengalas, compra sempre as mesmas camisas brancas e jeans idênticos uns aos outros e tem fixação pelo personagem Dom Quixote, do romance de Cervantes. Quando encasqueta com uma ideia, não há quem consiga demovê-lo. A mais recente é criar um complexo de entretenimento chamado Zytrons, uma espécie de Rock in Rio para crianças e adolescentes, com música e brinquedos, no Parque dos Atletas. “Medina é incansável e sempre surpreende por suas ideias inovadoras”, diz Chris Baldizan, vi­ce-presidente de entretenimento da MGM Resorts, dona de hotéis como Luxor e Bellagio, em Las Vegas.

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Roberto Medina com a mulher Mariana e a filha Raíssa
Roberto Medina com a mulher Mariana e a filha Raíssa ()

 Desde o ano passado, Medina tem passado longas temporadas nos Estados Unidos. Atualmente o empresário está instalado em uma confortável mansão em Beverly Hills, reduto dos artistas de Hollywood em Los Angeles. Ali, mora com a segunda mulher, Mariana, e a filha caçula, Raíssa, de 9 anos. Aluna de uma escola bilíngue no Rio, a menina estuda com um tutor. Os filhos mais velhos, Rodolfo, de 38 anos, e Roberta, de 37, tocam os negócios da família no Brasil. Dono de um inglês macarrônico, Medina jura que vai aprender direito o idioma assim que o ritmo desacelerar. Como isso não tem chance de acontecer tão cedo, continuará escorregando nas palavras da língua de Shakespeare. O inglês capenga não é empecilho para o dia a dia no país adotivo. Por lá, além das reuniões de trabalho, dedica-se a atividades que seriam impensáveis em sua casa na Barra, como ajudar a arrumar a mesa para as refeições ou lavar a louça. “Adoro ir aos supermercados daqui comprar bobagens”, conta. Quando está em Las Vegas, contém-se diante das tentações — diz que nunca vai além de 100 dólares nos jogos de azar. Apesar de adorar apostas arriscadas nos negócios, Medina não rasga dinheiro. 

As manias de Roberto Medina
As manias de Roberto Medina ()

 

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