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Agonia animal

Mais antigo do país, o Zoo do Rio sofre com a falta de manutenção e recursos

Por Letícia Pimenta
Atualizado em 5 jun 2017, 14h37 - Publicado em 9 mar 2012, 20h20

A entrada imponente do Jardim Zoológico do Rio, que dá acesso à alameda margeada por palmeiras-imperiais, por si só é capaz de deslumbrar os visitantes. Localizado no Parque da Quinta da Boa Vista, antiga residência da família real, o zoo carioca, fundado em 1945, reúne uma combinação única de história e natureza. Com essas credenciais, a expectativa em torno dos seus atrativos é grande. Mas basta atravessar o majestoso portão para a frustração tomar conta do passeio. Jaulas sem placas de identificação, recintos ociosos cobertos de mato, áreas interditadas e instalações em péssimo estado são problemas flagrantes. Em relação aos bichos, não é preciso ser especialista para atestar o comportamento estranho de certas espécies, que ora demonstram apatia, ora passam o tempo fazendo movimentos repetidos. “Nosso parque ainda obedece à configuração antiga, com jaulas pequenas, da época em que essas instituições serviam apenas à exibição dos bichos”, reconhece o diretor Luiz Paulo Fedullo. “É complicado mudar esse quadro, porque nos falta espaço.”

As carências da Fundação Rio Zoo, vinculada à prefeitura, vêm de longa data. A cada mudança de administração, os planos de revitalização são retomados, mas esbarram em outro ponto crucial: a falta de verba. Seu orçamento mensal é de 1,2 milhão de reais, sendo que 30% vêm da bilheteria e o restante de repasses dos royalties de petróleo e da prefeitura. Uma verba insuficiente e que cobre apenas os gastos com manutenção. Pelos cálculos da atual gestão, a receita ideal teria de girar em torno de 20 milhões de reais por ano, acréscimo que cobriria reformas e ampliações. Há pelo menos vinte anos o zoo negocia sem sucesso com os governos federal e estadual a cessão de um terreno vizinho, onde funcionava um estande de tiro do Exército. Com isso, sua área total dobraria, chegando a 280?000 metros quadrados, tamanho mais apropriado para abrigar o plantel de 2?700 animais, responsáveis pelo consumo de 2 toneladas de alimentos por dia, e os 130 funcionários, entre veterinários, biólogos e tratadores.

A ampliação aproximaria o zoo de similares que adotaram um modelo moderno, deixando de ser meras vitrines de bichos e transformando-se em centros de pesquisa e preservação. Tal mudança exige a construção de recintos maiores e semelhantes ao habitat dos animais. As grades são abolidas e várias espécies podem ser observadas em liberdade por visitantes que percorrem trilhas. Temos aqui no país bons exemplos dessa adaptação, como os parques de São Paulo e Belo Horizonte. No Rio, a metamorfose contribuiria para o bem-estar da bicharada, em especial dos que já chegaram ao local com distúrbios de comportamento. O exemplo mais chocante é o do urso-pardo Zé Colmeia, que vivia num circo em uma jaula de 3 metros quadrados. O movimento contínuo de andar para a frente e para trás e balançar a cabeça é resultado dos anos de confinamento inadequado. Na área reservada aos primatas, falta o que os especialistas chamam de enriquecimento ambiental, ou seja, elementos para os inquilinos se exercitarem. “É importante que o bicho não fique ocioso”, explica Luiz Pires, presidente da Sociedade de Zoológicos do Brasil.

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A falta de espaço que aflige o parque do Rio é uma questão complexa de resolver, pois depende da iniciativa de instâncias superiores. Mas os problemas de conservação visíveis em todo o complexo (veja o quadro) certamente poderiam ser sanados com mais rapidez. A falta de placas de identificação, por exemplo, compromete uma das funções primordiais de um zoológico, que é transmitir conhecimento e, assim, educar. Há planos para trocar toda a sinalização ainda neste ano e triplicar o número de empresas que adotam animais. Seria um bom começo. Hoje são apenas dezessete apoiadores, com doação média de 500 reais cada um.

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Embora não sejam exatamente parques de diversões, os zoológicos precisam ter áreas de lazer e gastronomia bem estruturadas para receber os visitantes. No complexo do Rio, além de haver poucas opções nesse setor, a decadência salta aos olhos. O descuido chega ao ponto de uma carrocinha de cachorro-quente funcionar ligada toscamente em um poste de luz. Mais uma vez, a direção garante que essa situação deve ser resolvida em breve, com a realização de uma licitação para apontar os novos concessionários de bares e quiosques. A entidade busca na Justiça a reintegração de posse desses espaços, hoje explorados por uma empresa que está inadimplente. Uma concorrência deve selecionar também quem vai explorar a loja de suvenires, fechada faz tempo.

Historicamente, os zoos brasileiros sempre se mantiveram de pé com dificuldades. O primeiro que entrou em funcionamento no país foi fundado pelo barão de Drummond no bairro de Vila Isabel, em 1888. Com o passar dos anos e a dívida galopante, ele buscou alternativas de arrecadação. Drummond inventou então o jogo do bicho, que perdeu sua finalidade inicial e hoje se presta a propósitos nada edificantes. Mesmo com a receita extra, o parque fechou em 1940. Diante do cenário atual, de visível penúria, seus visitantes torcem para que o complexo da Quinta da Boa Vista tenha um destino melhor.

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