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Junto com a massa

Desde o tempo do bonde temos carinho pelo transporte público. Pena que o investimento no setor seja tão pequeno e mal planejado

Por Ernesto Neves
Atualizado em 5 jun 2017, 14h35 - Publicado em 11 abr 2012, 18h35
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O carioca tem uma relação histórica com o transporte público de sua cidade. E isso vem desde o longínquo 1859, ano em que começaram a funcionar os primeiros bondes. Nos tempos mais românticos, seus bancos serviam até para fazer Carnaval, uma algazarra comparável à dos trios elétricos de hoje em dia. Quem é do Rio também costuma dar apelidos carinhosos a ônibus (como Laranja Mecânica, alcunha inspirada na antiga cor da linha 434, Grajaú-Leblon), além de fazer fila para visitar buracos e túneis de um metrô ainda em construção, como vem acontecendo na expansão para a Barra. Radicados em uma cidade que em grande parte se espreme entre o mar e a montanha, repleta de ladeiras e túneis, os moradores da capital sempre tiveram uma predisposição positiva no que diz respeito aos meios de transporte oferecidos e mantidos pelo poder público. Pena que nem sempre a realidade corresponde aos seus desejos. Ônibus que lembram sucatas, trens quase sempre lotados e um sistema de metrô que não evita atrasos, solavancos e até assaltos vêm fazendo muita gente optar pela solução que mais agride o meio ambiente: o carro. Já são 2 milhões de veículos circulando em nossas ruas.

Mas há pelo menos uma boa notícia a esse respeito. Uma pesquisa recente mostrou que cerca de 40% dos motoristas cariocas não fazem uso diário do carro. Trata-se de um porcentual alto, se comparado ao de outras cidades grandes, como São Paulo. Lá, mesmo com a restrição de circulação imposta pelo rodízio de placa, apenas 20% dos veículos ficam em casa. E isso já é melhor para o trânsito da cidade, além de ser um alívio para quem respira o seu ar.

Congestionamentos gigantes costumam causar, além de stress nos passageiros e motoristas, um grande mal para o meio ambiente, pois aumentam a emissão de dióxido de carbono, o principal gás do efeito estufa, responsável pelo aquecimento global. Estudos mostram que, no Rio, o transporte é responsável por 64% dos gases poluentes lançados diariamente na atmosfera. Quem anda de carro polui quatro vezes mais do que um usuário de ônibus e 26 vezes mais do que alguém que utiliza o metrô.

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Especialmente dos anos 90 para cá, os habitantes do Rio passaram a enfrentar significativa piora na qualidade dos transportes públicos. Nos horários de maior fluxo, o caos se instala, e os passageiros tentam encontrar espaço suficiente mesmo para conseguir manter-se de pé. Esse quadro, aliado a maiores prazos de financiamento nas concessionárias de automóveis, contribuiu para um incremento de 22% na frota de veículos desde 2003. Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o engenheiro de transportes Fernando MacDowell calcula que o carioca passa cerca de duas horas diárias preso no trânsito. “Teria de ser, no máximo, cinquenta minutos”, afirma. É duro constatar que, enquanto o velocímetro de carros modernos pode marcar até 200 por hora, a velocidade média de um veículo no trânsito carioca não passa de 30 quilômetros a cada sessenta minutos.

Quando o que está em pauta é o transporte, e ainda mais quando se tem preocupação com a sustentabilidade, o carro costuma ser visto como o principal vilão. De 2008 para cá, o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) vem realizando pesquisas para descobrir os modelos que consomem menos gasolina e que, por isso, têm menor peso no cálculo da poluição do ar (veja o quadro acima). O órgão também elabora um ranking dos veículos que mais queimam combustível, sendo, portanto, mais nocivos ao ar que respiramos. A lista integra o Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular, semelhante ao selo Procel, usado para testar a eficiência dos eletrodomésticos. No ano passado, foram verificados 105 modelos, de oito montadoras. No topo da lista dos beberrões estão os utilitários esportivos, modelos que chegam a custar 100?000 reais, sonho de consumo de boa parte de classe média emergente. Sonhar, como se sabe, não custa nada. Mas é bom, antes de sair comprando um, dois, três desses, pensar um pouco também.

ELES DISSERAM NÃO AO TRÂNSITO

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Em 2009, a designer Juliana Dominguez, moradora da Barra da Tijuca, na Zona Oeste da cidade, decidiu comprar um carro. O objetivo era abandonar os ônibus que fazem o trajeto de lá até a Zona Sul – seu escritório ficava na Urca. Optou por um modelo compacto, para se virar melhor entre as brechas do trânsito. Passaram-se poucas semanas e ela percebeu que não valera a pena. Juliana, seu marido, o fotógrafo Marcos Dantas, e em algumas ocasiões também o filho deles, Eric, de 3 anos, passaram a ficar quatro horas por dia presos em congestionamentos. “Houve dias em que perdíamos, com ida e volta, quase seis horas no trânsito. É o mesmo que se gasta para ir a São Paulo”, assusta-se. Para cumprir os compromissos diários, o casal passou a acordar às 5 da manhã. “Fiquei esgotada e deixei de conviver com minha família, pois o meu tempo livre eu passava dirigindo”, ela conta. Após seis meses de um cotidiano extenuante, o casal se mudou para Botafogo. Os dois logo notaram que o vaivém das ruas do bairro, um dos mais congestionados do Rio, não seria o habitat ideal nem para o pequeno Fiat Palio. Então, venderam o carro. De imediato a família sentiu um alívio nos gastos: sem ter de botar combustível nem pagar seguro, 700 reais vêm sendo poupados por mês. Para levar o filho à creche e trabalhar, agora no Centro, a designer não demora mais do que quarenta minutos. Vai de metrô. E adotou rotinas mais saudáveis que os engarrafamentos diários: “Nos fins de semana, passeamos os três de bicicleta. Se eu ainda tivesse carro, ele certamente estaria encostado na garagem”.

clique na imagem abaixo para exibir a pesquisa do Inmetro sobre o consumo das principais marcas de carro

[—FI—]

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